17/06/2005

Festa

Por causa da profissão que tenho (e que devo ter escolhido na minha fase de sonambulismo militante), acontece-me bastas vezes dar por mim em festividades para que nem fui convidado. Faço de repórter, embora não use chapéu com cartão "press" entalado na tira que circum-navega a copa. Repórter estava eu numa festa de ricos a quem três vezes por ano dá a pancada de oferecer latas de atum e bolsas de estudo a pobres. Vi-a, então. Era uma rapariga vestida de negro e encarnado, como na capa do livro de Stendhal. Olho verde, só para fazer tropeçar a quadricromia. Anca rija, de não navegada. Linda de nascer. Não sei quem era, não sei quem continua a ser. Sei que a festa acabou. Para mim, acabou. Suponho que ela continua, aeróbica, a valsar entre verticais bolhinhas de champanhe e tremendos lírios cervicais. Vim para o jornal e escrevi uma coisa de 900 caracteres sobre a festa. Mas, na verdade, não disse nada.

Ave e Rio, O Aveiro, 5 de Julho de 2001

1 comentário:

Anónimo disse...

Bonito. Sempre foste um gajo de Olhão e do Olhanense.


ass: talochas

Canzoada Assaltante