Qualquer solução económica é válida, desde que não implique o penhor do coração.
Talvez devesse ter sido pintor. E foi-o, mas de paredes. De quadros, não. Sem mensagem, sem técnica, não empenhou o coração em borrões.
O corpo tem possibilidades. Tem de ser corpo, por isso pode ser corpo. Pode ser um rio, embora viva na margem. Pode fazer isso com a imaginação, criando imagens. O corpo pode criar-se.
Magia brilhante na noite: no quarto escuro, deitado, só, o corpo fotografa o que mora para lá, criação de cá.
A sociedade não tem sócios voluntários, só municipais.
Nascer não é de vontade.
Cão de ouro e nácar. Presença do cão. Raciocínios gestuais do animal. Linguagem orgânica (organizada) dele. Sons dele. Cheiro dele.
Citar, recitar, excitar, concitar: estar.
Nomes dos objectos: quaisquer nomes, quaisquer objectos – não enlouquecer.
Saber cedo de mais é perder para sempre?
A cabeça do homem envelhecido é bela: a beleza é jovem, apesar do portador.
O amor torna-se Japão: atraente e longe, ou uma coisa porque outra.
Cada um sabe.
Trabalho na obra. Trabalho nas obras. Singular, plural. Trabalho só. Trabalho, só.
Nunca entreguei. Não é possível entregar?
Nos meses portugueses sem R se apanha e come o caracol.
Alma, não. Lama, sim. Mesmas letras, outra ordem e outra desordem. Isto importa.
Ainda. Ainda assim.
O escritor é parido pelo leitor. É filho dele. O filho ensina o pai a revisitar o sabido.
Não esquecer os números. Contá-los como se conta uma história.
Ainda há tempo.
Um quarto para dormir e morrer. Uma cozinha. Uma latrina. Uma sala para pintarscrever. Tudo o que é preciso.
O lume e o gato: calor por calor, nada contra nada.
Balões: cor, ar, calor: partilha de letras pinceláveis.
A minha força, a minha dissipação: sangue, leite, água: a minha vida: tinta.
Só os animais são sexuais. Os humanos são eróticos, quando podem.
Pombal, 24 de Junho de 2004
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