PAOLO ROSSI
(1956 - 2020)
Via-se os jogos do Mundial no Restaurante O Sonho
207.
SONHO FECHADO SEM SER PARA OBRAS
I
Morreu ontem Paolo Rossi, estrela de Itália no Mundial de 1982, realizado em Espanha. Tinha 64 anos. Recordo viva & vìvidamente os momentos em que ele demoliu o Brasil naquele torneio que a Itália acabou por vencer. Esse hat-trick inesquecível, conseguiu-o Rossi naquela segunda-feira numerada 5-de-Julho-de-1982. Viveu pouco tempo, a glória é porém com ele.
II
Não me têm visitado muito.
Refiro-me às palavras já prontas a servir.
Tenho pasmado sem dor na consumação dos dias.
Vai-se escoando pelo ralo este ano abstruso.
A televisão conta, todos os dias, mortos novos.
Conta-os sem ser pelos dedos.
Ladra, altífona, a ganância das farmacêuticas.
Anda tudo a virar o cu a vacinas talvez-sim-talvez-népias.
Sim, é um tempo-não, este.
Modo tem de haver outro. Ou não tem.
Já não é 5, nem Julho, nem 1982.
Recordo porém mui bem essa segunda-feira.
Era então recente a minha maioridade.
Via-se os jogos do Mundial no Restaurante O Sonho.
Esse estabelecimento há muito fechou portas.
Ao lado dele mora a senhora dona Alice Duarte.
Tem 101 anos, nascida a 15 de Setembro de 1919 (segunda-feira também).
É muito boa senhora, muito gentil.
Fizeram-lhe uma festa bonita pelo seu centenário.
Também acontecem coisas boas na vida.
III
O rapaz voltou por duas horas, não mais, ao bairro original. Mudou o que (& quem) tinha de mudar. Permanecia alguma coisa do que tinha sido. Qualquer poupança não faria, ou teria, agora grande sentido. Porque morrera quem poupara? Sim. O rapaz ainda conversou um pouco com alguéns remanescentes. Escolheu não ir por ali mais longe. Caminhou pela berma, passou as fábricas aluídas, não olhou nem fotografou os destroços, tomou café no outro bairro, já impessoal vizinhança. Apanhou depois o autocarro, viu a Sofia do senhor Carvalho, que o não viu ou fez que o não viu. Saiu na segunda paragem a seguir à gare ferroviária. Comentou só para consigo a iminência pluvial. De facto, começou a chover às quatro & 13 da tarde. A poalha de água fez-se bruma, pouco se via derredor. O rapaz abrigou-se sob o patamar da galeria antiga. Ali funcionava a Barbearia Lampião, podia ler-se o Jornal de Notícias no tempo de espera. Há muitos anos que tal lampião foi apagado. São como são – tanto as coisas da vida em geral quanto as do comércio em particular. O rapaz é quem o diz. Ou dizia.
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