03/01/2021

VinteVinte - 174 (X)




X


É certa a dissolução corpórea, de incerta nada tem. 
Isto tido em devida & lúcida conta, tudo bem. 
Sigam os jogos, quais eles forem. 
Juízes & algozes não escapam ao cadafalso, nem eles. 
Tal verificação resulta em conforto ao atento. 

Anos são rodagens em torno do sol. 
A descomunal silveira estelar não paga copos. 
Em transumância, a horda humana mais bale do que vale. 
Quieta, a mesma coisa. 
A única moda é morrer, dar lugar, calar o bico. 

Negativismo – clamarão alguns. 
Com certeza, gente: clamai para aí. 
Conheceis alguém que tenha voltado? 
Alguém que explique isto tudo? 
Alguém que não saiba que isto tudo é nada? 

O indivíduo compele-se à liberdade una. 
O deserto que confronta é total. 
A noz cerebral é quanto tem, além de pés & mãos. 
Está a sós no que compreende. 
Está a sós no que incompreende. 

Maciel disse-me que não vale a pena chorar ao espelho. 
Que mesmo sozinho se faz a mais triste figura. 
Concordei de imediato com ele – até porque o sou. 
O que me surge em sonhos é tão-só da casa mal iluminada. 
Não dorme monstro na minha banheira. 

É de todo indiferente ao que escrevo o que sonhais adquirir. 
É-Vos de todo irrisório quanto escrevivo em subúrbio. 
Lendo hoje o primeiro volume da bibliografia de Maugham, sorri. 
A mocidade dele quando o escreveu, o para-quê de tê-lo feito. 
Sei pouquíssimo – e não por humildade (m)o reitero. 

Vila do Conde & Póvoa de Varzim disputavam-se pátria do Eça. 
Parece que foi na Póvoa que o ilegítimo rebentou. 
Foi morrer à cintura de Paris, mais novo do que eu sou hoje. 
Serão deveras dele os ossos depositados em Tormes (ou alhures)? 
E que será (des)feito dos do tenro Cesário? 

E porque a eternidade não é ideia abarcável, haja jogos. 
O jogo da escravatura como o do deus. 
O jogo do diabo como o do turismo. 
O da culinária como o da velhice. 
O da política como o do versilibrismo. 

Mínima consolação acontece por vezes à passagem. 
Perder o nome – e até a sombra – ante o mar. 
Durar todo o inverno sem receio nem fé. 
Observar a infância antes do matadouro. 
Quebrar pelos rins a rigidez da desejada. 

E nada leiloar, nada arrematar. 
O ponto está em fazer isto sozinho. 
Só sozinhamente pode isto ser feito. 
Venha quem (não) vier, igual. 
A pessoa está nas suas mãos mesmas. 

Também isto é certo, 
não tão-só a dissolução. 




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Canzoada Assaltante