164.
CALA-ME IDADE
Coimbra, quarta-feira,
14 de Outubro de 2020
I
Demócrito, diz-se que ria das humanas insanidades.
Heraclito, parece que ante as mesmas chorava.
São antigas fontes; a do riso como a do pranto.
Entre uma & outra há-de o siso morar.
De ledoras delícias ando eu agraciado.
Uma delas me resulta do brilhante O. Henry.
Foi civilmente William Sydney Porter.
Viveu poucos anos, 48 só (1862-1910).
II
Disparam os alarmes. Em França, vai ser declarado o recolher-obrigatório entre as 21h00m & as 6h00m. Por cá, vamos passar para o estado-de-calamidade. Aventa-se que o Governo pode obrigar ao uso de máscara (também) na rua. Comédia global, infecto planeta, tristonho carnaval.
III
Chegam pela máquina-de-fazer-estúpidos, vulgo televisor, imagens de um mundo repelente. Bem o assentou o grande Orwell: triunfam os porcos em toda a linha.
Mais me obrigo a r-existir – à minha maneira, que outra não tenho, nem ensejo, nem conheço. Hoje foi dia de O. Henry, mormente. Em boa-hora regressei à escrita dele, anos muitos passaram desde que a conheci. Ele é riqueza contadora. Sabe como muito poucos expor uma situação, mover as peças, organizar o fluxo de dados, rematar a história. O volume de 25 short-stories que tenho em mãos é The Trimmed Lamp, precioso voluminho originariamente publicado em 1916, sendo reeditado em 1953 pela PAN Books. Adquiri o meu exemplar, em segunda-mão, a 22 de Maio de 1996 (quarta-feira), ali ao Arco de Almedina. O dono original não assinou (mas sublinhou muito, a tinta-permanente azul) – deixou todavia a sua data de aquisição: “Viseu – 28-XII-1954”. (Terça-feira.) É pessoa para já não ser vivo, tal remoto leitor. Que leu o livro todo, leu – todas as histórias estão (interessantemente aliás) sublinhadas. Ou seja: leio a minha leitura & leio a leitura dele. Uso óculos para a minha, mas é a olho-nu que olho por ele.
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