14/12/2020

VinteVinte - 153 (I, com cortes)

© DA. 13 de Janeiro de 2015 ‏‎(3h59m54s)


153.

 

POUCO TEMPO SE É

 

Coimbra, quarta-feira, 30 de Setembro de 2020

        


    I

    De seguida ao inominável espanto
    consolidam-se os ossos já não tenros.
    Nascer, volta não-mais – nem por encanto.
    Pouco tempo se é dentre os pequenos. 

    Mesmo assim, ele há que perseverar respirando. Nem todo ou tudo se revela tempo-perdido. Alguns instantes ressoam puros na atenção dinâmica.    

    A palavra-justa algumas vezes é trovada.
    Alguma que dizemos por aparatosa quimera.
    Outra que não perdemos nem damos por achada.
    Aquela que nos define por ser de nós a que se espera.

    (...)

    Reencontrei, de há trinta & tais anos, carta
    que M. da C. me enviou por ocasião
    da Rainha Santa, q’encanta & nunca farta
    a grei minha conterrânea deste torrão.

    Nela, carta, dizia-me M. da C. da atenção que vinha dando a um C.A., feliz contemplado. Não sei se nem que lhe respondi. Felicidades, talvez – como se a felicidade tivesse plural.

    Toco a pessoa que tu não és
    com dextra mão que não é minha.
    O amor é doutros, só assim feliz.
    Esta é, do Diabo, a velha manha.

    À saída da hodierna visita (...), o verso
    
    De seguida ao inominável espanto

    impôs-se-me sem que lhe ofertara eu resistência. Muito dist’assim me acontece – e há décadas que diariamente. Como seja com outros afins tontos que escrevem – pois não sei, não posso saber, nem quero. O vocábulo espanto é muito raulbrandãoniano – e eu faço por não emular jamais. Mas. 

    Tenho visto filmes próprios de olhos bem fechados.
    Sei-me sozinho na visão, nada q’enganar.
    Os mortos surgem neles sem ser figurados.
    Só comigo eles acabam em meu mesmo acabar.

    Perto de onde de momento escrevo, passa uma sirigaita seca, madurota de seus cinquentas, vozeando que Deus a tem amparado muito na quimioterapia. Nem lhe pergunto onde andava Ele quando as células se volveram malignas adentro a dita sirigaita, cultora de frases-feitas que nunca explicaram nem explicarão aquilo que se segue

    ao inominável espanto.



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