141.
AGOSTINHO, NÃO FAÇO IDEIA D’ONDE
Coimbra, sábado, 12 de
Setembro de 2020 (I)
Coimbra, domingo, 13
de Setembro de 2020 (II-III)
I
Provenho de um país restrito, delicado, portátil.
Alguma educação permite-me habitá-lo na íntegra.
Ela mesma me faz lograr o mar em terra plena.
A uma lareira, a sós embora, mantenho companhia.
Conversando, milhas terrestres & náuticas irmanam-se.
Um diz-nos de sua mãe italiana, formosa, definitiva.
Outro, do que penou em orientes insensatos.
Eu mais escuto do que profiro, à cautela.
Atrás de nós, franca & farta, a mesa com vitualhas.
(É como nos sonhos, só que em papel.)
Pessoas passadas de idas vidas são evocadas.
Episódios mínimos de microvidas fazem-nos sorrir.
Fazem-me sorrir, mesmo se o vazio é o que miro.
Um homem resiste sempre até não ser corpo.
Sabendo inexistir o além, vale mais o aquém.
Como quando acendiam fogueira no largo para todos.
Sumiram-se cerce & céleres os a que chamei meus.
Pastoreio-lhes a lembrança por serras que nem vejo.
Gosto das pedras, milenárias todas elas, resistindo.
Gosto dos carreiros tortuosos & pisados quais destinos.
O meu país envelhece comigo, mas olhai bem:
o de as minhas Filhas, delas & nelas rejuvenesce.
Natural lei que do humano não depende, portanto justa.
As décadas confirmam-no sem excepção.
Não é mau irmos aprendendo as constantes vitais.
Nasce-se sem defesa, felizmente ignorantes.
Depois a coisa melhora, há os tais carreiros.
A hora vem de extinguir-se o lume.
Muitos somos os náufragos, legião de sozinhos.
A verdade é desaprendermos a temer ques ou quens.
Não importa. Um pátio chega para tombar morto.
Não é preciso palacete nem panteão.
Outros virão.
Mas, olhai, não:
não a pessoas me refiro
mas a poemas.
Este meu é o país deles.
(II)
(Ela sempre, como o sol, radiante.
Sempr’ela, como a rosa, radiosa.
Salão celeste à lua exuberante.
Dona de seu segredo, capciosa.)
III
Saí um pouco este domingo, vi as casas do alheio.
O rio nos sítios dele, o arvoredo q’inda resiste.
Coimbra é um bom deserto, ninguém existe.
Anda-se à bel’-vontade, o mundo nem é feio.
Toquei pessoas, cujo botão é disponível.
Desataram todas logo a dizer-se.
Eu penso que há sempre matéria sensível.
Preciso é que ninguém vá com tal ofender-se.
Onde estará Agostinho, que aqui trabalhava?
Q’será feito de quem se desfez desta história?
Onde a dos Areias? E a dos Peres, q’andava
a reparar limalhas da metal-escória?
Sem comentários:
Enviar um comentário