14/11/2020

VinteVinte - 115 (íntegro, que é p'r'aviar)




115.

 

MAS ANDAR AO CARTÃO ’INDA HÁ-DE SER PIOR, DIGO EU

 

 Coimbra, sexta-feira, 7 de Agosto de 2020

 

 



Sete-d’-Agosto-2020
Faz amanhã 42 anos a morte de Ruy Belo
Mas não faz porque é viva (viva!) a poesia de Ruy Belo
A isso tudo indiferente a manhã de Coimbra
Acaba-se a manhã de Coimbra sem conto ou história
Sete-d’-Agosto-VinteVinte-Sexta-Feira.

Desgosta-me, que a desdenho, esta era sem hora
Esta por assim dizer era sem heráldica
Muita maquineta colorida, muita maralha cinzenta
Repugna-me esta arrebanhada acefalia sem porfia.

A poesia de Ruy Belo segue latindo à lua solar
Os fins dela são os princípios do homem & vice-versa
Dois aposentados marulham rumorosa conversa
Na parte da esplanada que a sombra quer partilhar.

Somos, daqui Varanda-do-Mondego, os bastidores
Do içado Cemitério da Conchada bem vetusto
Ando para versar Filippe Simões, de baptismo Augusto
Que talvez lá inumado seja sem esplendores.

Esplêndidas dores são as do que, mortos, ’inda vivem
Falo dos gajos bons de não (con)sagrada escritura
Olho derredor: fora & dentro, sinto a secura
Ninguém fala bem, aparecem quantos que não convivem.

O meu pronto isolacionismo não é lindberghiano
Esse pseudoariano voador de raptado infante
O meu ser-sozinho é o meu projecto-d’ano
Após-dia-após-ano, daqui ’ora-&-doravante.

Pessoas doidas como vespas exiladas
Barafustam capitéis gestos colunares
Infestam, graçazadeus, as esplanadas
De seguranças-sociais & afins bares.

Vi na televisa paisagens nevadas
Que desejei muito como dantes a senhoras
Ali desejara eu meus nadas
Gastar nelas as dessoradas horas.

Ironia antes de maiêutica, destruir p’ra construir
Acabou resultando na individual morte socrática
A ignorância humana é fatalmente matemática
A superstição que foi, está na que há-de vir.

Descreio do desumano ingénuo género a que pertenço
A minha roda dá meio-dia & guerras mundiais
As menopausas urdem róseos carnavais
Que cinza são eles todos – e a rodos virais.

(Em mais simples dizer?
Também tenho:)

Vim – que Luís me trouxe – à terra-santa
Retrazer-me não retraz, pois que morreu
É triste atrasar tanto o que s’adianta
Isto é certo, bem certo, pois que o digo eu.

Construí bem construída uma solidão atenta
Colecciono, não lecciono – leio & sei(-o)
Andei & ando nas obras. Também nas sobras, violenta
Contaminação do natural-ambiente-meio.

Tenho perguntado a meu corpo se a velho chego
Faltam 21 anos para o total do meu Pai
É resto míope, próprio mais de morcego
Mas ó Mãe & Pai: amor que m’adentrastes já não sai.

Transito afinal simplesmente idades comuns
De Aveiro a Leiria, de Peniche a lado-algum
Vem o carteiro, traz morticínio de atuns
Que é tourada-espectáculo no Algarve comum.

Raro saio da Língua para exercer realidade
As pessoas fizeram contas, houve resto-zero
A minha pobreza chama-se liberdade
S’fôda povo, s’fôda nobreza, s’fôda clero.

Ou não.
Ou então não.
Ou então algum humanismo ortográfico
Enquanto houver moedas que na rua me sustentem
Alguma coisa a que os meus Idos Ex-Vividos atentem
Alguma coisa do meu pendor, digamos, orográfico.

Ou então
Exercer língua-de-cartão
Ser correcto, não ser insurrecto, ser malandreco
Exercer na reforma a régia covardia
Que nos fingiu de coragem a vida toda
Mas
S’fôda povo, s’fôda nobreza & a clerezia s’fôda.

Sete-d’-Agosto
Ontem 75-anos-Hiroshima
Amanhã-42-Ruy-Belo
Sombra pinta chão sobre chão guardado.

COMUM:

A Pátria é bem da Mãe Extinta
Rumor que o Mar já não condena
Toda a força há-de valer a pena
Da verdade só que jamais minta.

Quem é que, vendo o Mar, jamais o queira
Ter em casa por seu quintal?
Quem nunca lhe chamou Portugal?
Quem da vida se viu sem-eira-nem-beira?

ESPERA:

Sete-d’-Agosto-2020-de-Fiada
Faz hoje zero anos que m’entristece
O ser nada, olha aí, não apetece
SetedoOitoVinteVinteNadaNada.


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Canzoada Assaltante