146.
POSSES & TOSSES DO TIPO PASSIFLORA
Coimbra, segunda-feira,
21 de Setembro de 2020
Estes são deveras dias contados.
Muitos mortos que até o nome perdem, pois que contados a granel para a estatística das direcções-gerais & dos noticiários mais estentóreos. Os restantes – ou estão à rasca nos cuidados-intensivos ou assintomaticamente por aí andam a assobiar para o lado.
Ano esquisito, que vou (vamos todos, afinal) curtindo a salitre mais ou menos amargo. Mais ou menos – por ser conforme as posses & as tosses.
II
A 11 de Abril de 1983 (uma segunda-feira, como hoje), numa ala do quinto-piso da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, conversei com uma rapariga bonita de cara & algo aeróbica de cocuruto mental. Eu só queria falar-lhe de literatura, mas ela preferia narrar-me amiúdo as trepidantes aventuras da vida doméstica – da casa dela como da das vizinhas. O que cada um gastava em mercearias, roupas, saídas a restaurantes, cosméticos. Acabei naturalmente por saltar-lhe para cima, menos de um mês passado. Mas só agora descubro que quatro anos exactos depois daquela manhã – portanto, a 11 de Abril de 1987 (um sábado) – morreu Erskine Caldwell, esse mesmo senhor-escritor nascido exactamente noventa anos antes da minha Leonor.
Sempre consegui, pois, neste tempo em que o polvo custa os olhos da cara, os restaurantes estão fechados à força e o verniz das unhas se lasca todo como se já viesse feito de acetona, dizer-te alguma coisita de literatura, Natércia Ludovica.
III
Entre rentes de prósperas andam passeando favorecidas.
Aqui miram petúnias, além pasmam ante melhoras.
Horas-felizes vivem a favor de clemências nutridas.
Despedidas dão às lentas, às dignas & às passifloras.
Sou metade desse par, esse que mirando anda harmonias.
Dias desfazem-se anos, mas há que dar de beber ao andor.
A cor é catita, alastra mui bem pelas malvasias
– e as pias dão a plenas & a hidras mor esplendor.