Desapareceu de casa de seus pais um órfão, maior de 45 anos de idade. Pela última vez que foi visto, envergava uma camisola de cavas amarela com um boneco do Naranjito, mascote do Mundial de Futebol México-86 (ou Espanha-82?), umas calças castanhas coçadas ao longo de tardes e tardes de chuva e silêncio no interior da casa que foi de seus pais e agora era dele, um par de sapatilhas encarnadas rotas à frente pela pressão incompreensível (crescer para quê?) das unhas dos dedos grandes, um ar de quem usa chapéu sem chapéu e uma expressão de periquito agoniado por ouvir tanto Brahms imaginário, na casa não havia gira-discos nem rádio parado na Antena 2.
Chamava-se Alberto Minde Rico, não constando que alguém tenha alguma vez entendido o que dizia. Antes do desaparecimento, era visto passeando pelas margens do lago de lixo junto ao mercado abastecedor da cidade. Parece que gostava de rãs e de pássaros verdes, que sempre deixou em liberdade apesar de lhe povoarem sem medo as mãos e os ombros.
Alberto, como toda a gente, às vezes chovia e outras fazia sol.
E agora, como toda a gente, desapareceu. A casa vai a hasta pública. Um japonês já telefonou a dizer que está interessado, mas ele há sempre Hollywood e a questão dos direitos.
Imagem: © Chema Madoz
Texto: Tondela, tarde de 19 de Julho de 2005
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