Quatro pinheiros mansos como bois bordam uma encruzilhada que faço a pé todas as manhãs, cedo no dia.
Eles farfalham, contentes de lhe dar o vento nas axilas.
Ainda esta manhã os respirei, gozoso.
Ontem à noite, abandonei por momentos a casa e a Virginia Woolf. Tinha comido uma conserva, dois pães, um pouco de queijo. Apetecia-me café. Saí. No lusco-fusco da aldeia, os passos britavam areia. À porta do estabelecimento, a dona conversava ao fresco com um casal de aldeãos. Tomei uma chávena enquanto pensava na cara. Entre a minha casa e o café, uma cara passou por mim. Feita de pedra e de sombra, uma cara de mulher dura. Foi só isto, mas ficou-me. Voltarei a vê-la: a aldeia é pequena.
Comprei uma botija de gás no sábado à tarde. O rapaz das bombas queria ajudar-me a pô-la no carro. Agradeci-lhe, disse-lhe que não era preciso. Ainda não é preciso.
Jantei num pátio à sombra de tílias. Em redor, famílias grelhavam pequeninas maledicências sobre outras famílias. Um cãozito baixote e antigo estacionou-me aos pés, o olhar flechado para cima, à espera. Manso como um daqueles pinheiros. Dei-lhe um bocado de carne. Cheirou-o, agradeceu-me com um relance dos olhos piscos e comeu devagar como um cavalheiro.
Antigamente, eu só andava para ir. Agora, também regresso. Não sei se anda aqui alguma coisa de velhice, nisto. Se anda, ainda bem que anda: é bom.
Amanhã de manhã, se o coração me não trair, levanto-me com a certeza dos pinheiros. Içar-me-ei mansamente.
Imagem: © Chema Madoz
Texto: Tondela, tarde de 19 de Julho de 2005
Texto: Tondela, tarde de 19 de Julho de 2005
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