09/03/2009

Repetição

© Emmet Gowin
Edith and Ruth
Danville, Virginia (1966)





Souto, Casa, noite de 9 de Março de 2009



A repetição das ovelhas na vida
Como a dos carneiros na insónia
As pessoas galeriadas tais quadros ex-vivos
Ex-votos de seus rostos mesmos
E o pudor da vida contra a sensata morte
E andar nisto ao mesmo dizendo-o diferente
A sorte a morte o destino o tino a correnteza
Depois vem o ano a gente dá-lhe um nome um número
A gente é feliz se faz sol perto da capela
Onde o homem do peixe diz alto como um sino
Ligado a Deus por bateria e preços a giz
Esbugalhados os olhos vítreos dos frutos do mar
Os frutos do mar comedores de cabogramas
Infâncias e senectudes e latas e sons pressurizados
Tudo num tempo de bocas firmes e desoladas
Tremem um pouco as mãos na acepção certa
Tinem os pires de porcelana nas têmporas
A cabeça é a rosa a que sobe a chuva de maio
Muita gente se pudesse evitaria o nó dos Francos
Congestão de tráfego em direcção à do Brasil
À dos Estados Unidos da América
Em Celorico da Beira a esta hora fazem sopa
Em Setúbal um homem está desesperado mas finge
Em Lagos as coxas morenas da casada abrem-se ao rapaz
Vão os animais humanos frequentando a duração
Lá em cima lá em baixo as estrelas gaseiam espirais
Fragmenta-se o dente na dura palavra que o move
Os mitos são baratos são muito acessíveis
Inez de Castro em software à escolha
Com Pedro ou sem Pedro e Dom Afonso a fazer de Darth Vader
É tudo tão fácil cada vez mais fácil com a idade
A gente vê o tabuleiro sem pedras já sabe como acaba o jogo
Dois ou três telefonemas combinam a esplanada do rio
Num sábado fingimos como se tudo fosse Setúbal
Ovelhas e carneiros onde aquele homem que finge por amor
Aquele homem que finge por amor de quem ama
A esta hora numa sala tomada pela noite ouve-se Bruckner
A esta hora é possível ouvir um ribeiro dormir nele
Tantos barcos voam no fundo do mar cheios de madeixas
Os peixes devoram os cabogramas não enviados
Ondulam numa pessoa tantas austrálias tantas astúrias
À boca sobe Celorico da Beira desce o ralho mais azedo
Não estamos aqui muito tempo não nos dói nada
Nos coliseus juntam-se as ovelhas os carneiros os holofotes
Celebra-se algures a comunhão de uma ave feminina
E Bruckner acaba amanhã é outro homem mesmo em Lagos


1 comentário:

Anónimo disse...

a esta hora é possível, daniel. um beijo grande.

Canzoada Assaltante