II
Visão nítida de povoação em orla de bosque. Formosos
ambos, aglomerado & arvoredo. Ruas limpas, as da vila. Mata também limpa,
bem cuidada pelo gentio. O conjunto não é forçosamente edénico. Ocorre-me As
Pastagens do Céu, do velho Steinbeck que me robusteceu a adolescência
ledora. Já houve crimes em algumas casas. Pelo menos oito suicídios em quarenta
anos na floresta. Coisas assim, tristes, definitivas – e esquecidas por quem
pode. A alegria, como se geralmente consabe, não tem nem dá grande conto.
Temos daqui ao mar quarenta quilómetros meados. Até ao
litoral, arrozais, milheirais, canaviais, restos lacustres de milénios improváveis.
As aves patrulham a Hora-Perpétua. Chãos aquosos dão de comer a cegonhas,
milhafres, pardais, filiformes cobras-d’água. Raros humanos dão conta de
trabalhos inçados de solidão.
Não é minha veleidade imaginar-a-dar-a-ver currente
calamo só porque sim.
O tal bosque é tal. O tal povoado é tal. Escrevejo-os
em conformidade com a íntima régua – ou pauta – de uma fidelidade que dá luta,
não-raro agreste & alcantilada, ao inefável. É como esbracejar no deserto,
arreigadamente o sei.
III
Gasto o meu latim & o meu nanquim derradeiros –
refiro-me a derradeiros tendo 55 anos de idade, não é que esteja para me
dar o badagaio, t’arrenego-satã. Às oito da manhã de amanhã, 56 ninguém mos
tira. Curiosidades: uma, tal como meu dia natalício, 8 de Maio de 2020 é
sexta-feira; duas, a serenata da Queima das Fitas é, como em 1964, às
zero-horas de 8. O triste é que este ano a serenata não vai ter audiência
presencial, por causa da praga chamada COVID-19. Em ’64, o Instituto
Maternal era ao pé da Sé Velha. Internada à minha espera, a minha Mãe ouviu a
serenata que se celebrava na escada da tão antiga catedral. Neste Ano
VinteVinte, tristemente, a serenata vai ser cantada na escadaria do Pátio das
Escolas. Por determinação higiénico-sanitária, ninguém assistirá presencialmente.
A tradição vai ser transmitida por uma das estações televisivas cá do pátrio
terrunho. Não há Queima propriamente dita: nem cortejo, nem noitadas, nada. As
minhas ainda eram no Parque, as de agora são na margem esquerda do Mondego.
Amanhã, portanto, 56. É um pouco estranho. Eu não
gostei de fazer 30. O meu último aniversário propício, feliz até, foi o 23.º. A
partir daí, a brincadeira perdeu graciosidade, veio caducando, outonou-se cedo,
mijou sangue pelos olhos. (Sim, aprecio auxeses.)
Pela primeira & penúltima vez, fui pai aos 29 anos.
Pela segunda & última, aos 35. Posso pois dizer que a minha vida tem
duplo-sentido. Vós compreendeis-me decerto neste ponto – e sem esforço da V.ª
parte.
Às oito da manhã de amanhã, resta-me renascer – mas
desta vez sem Mãe. Sou capaz de desenvencilhar-me sofrivelmente: ando nisto há
muito ano.
Sem comentários:
Enviar um comentário