03/05/2021

PARNADA IDEMUNO - 308 (derradeira entrada de 5.ª-f.ª, 29.4.2021)

© DA.


308

    Álea de pereiras-de-inverno, perene em revivescência minha.
    Ádito (via, acesso, caminho, estrada, estirada) de nenhures a lado algum.
    A casa grande afasta-se, se dela aproximar-me asinha
    intento, retrógrado afinal cada passo, um por um.

    Nas quatro linhas iniciais, dá-se (dei eu, pronto) largas a certo elogio da letargia. Não faz mal. O cenário das pereiras-de-inverno recorre-me muito. Era real – e pertence a um arquivo feliz. Entre as árvores referidas vi vivo ainda o meu materAvô, falecido fez em Março último 49 anos. Por entre as mesmas passe(e)i com o meu Pai, conversando nós sem precisarmos de abrir a boca. Assim era de facto muitas vezes: coisa de o mesmo sangue correr por dois corpos.
    Por falar em corpo – é a este que o Tempo tem de aniquilar para que essências como a memória, o amor & demais violências afins sejam pulverizadas de vez. Sabendo-o, o corpo inventou a escrita.
    Aos cinco anos, entre pereiras-de-inverno, alguma coisa em mim sabia já disto por mim: a não ser assim, por que raio escrevo?
    (A esta pergunta, que é retórica, vou dar resposta recorrendo a linhas, por assim dizer, contrapontísticas. A saber:)

    Sou grato ao que & a quem não perco, mesmo querendo-o.
    Assimétricas marés lambem a mente, é vesga a Lua.
    Na aldeia de meu cunhado, o melhor manjar – e, oferecendo-o,
    queria deveras tal casal nossa fosse a casa sua.
    Abomino o pré-juízo & a vil voluntária ignorância.
    Tétricas galés merecem cuspinhentos escarnecedores.
    Devo, é certo, algum dinheiro – não já porém favores.
    Do que sou ao que lhes pareço, não é pouca a distância.

    Gabriel, Carlos, Júlio, Mário, Jorge-Luís, Osvaldo, Aleixo, Gonçalo, Eduardo, Xavier, Manuel, Alberto, Pedro-Paulo, Jorge-Sim, Nicolau, Octávio, Tony, Roberto, Raimundo, Francisco, Tomás, Jaime, Marcelo, Fernando – a todos, a cada um por cada si, uma pereira, dessas que ao inverno pedem o nome. Não creio, em absoluto não creio, que não fôsseis, sim Vós, capazes de enumerar outra tanta onomástica a quem d(o)ar uma árvore.
    Sem abrir a boca, meu Pai foi Abrunheiro a que me deu.

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Canzoada Assaltante