17/02/2010

Vã Polimatia do Viajante Doméstico (5)


(5)



Souto, Casa, tarde de 15 de Fevereiro de 2010







O espírito da água, a alma do frio, a mente da neve, aldeias serranas um pouco mais isoladas que de costume. Ao lume da Língua, porém, a invernia é vencível. Olha-se o vasto nevão, pena o número de corpos mortos que amanhecem na Lisboa dos sem-abrigo. Nada tão tóxico quanto a miséria social. Massa de ar polar, fustigação inclemente. E nós ao lume da Língua, sem ademanes de violência física, psicológica, sexual, laboral e/ou financeira. Viaturas devagar pelo piso escorregadio. Sim, a Língua é o mor mercado abastecedor da Realidade: a Idade Real da pessoa. Muita biologia, uma necrologia só. Tarólogos de pechisbeque e necromantes taumatúrgicos. Lobos, linces, leopardos, lagartos, libélulas. A elegância de uma figura chamada Robson. A cidade de Praga, música e fome. Os comboios belgas, incerto número de mortos em resultado de uma colisão tremenda. Subhas Chandra Bose. Catacumbas, piolheiras jamaicanas e afins, árvores afaga-céus, Cro-Magnon e Gianni Versace. O semblante siamês pinguins/empregados-de-mesa. Badajoz & Elvas, como naquela canção daquele parolo. As pestanas ruças de uma figura chamada Volkman. Real porque escrito, o nome Karp. Na morte encontraram final reduto os despojados de Lisboa, tão como os da Polónia sem abrigo e sem nada em esta vida. No País, campeia a tacanha corrupção dos instalados da “Democracia”. A padralhada pedófila irlandesa recebe o Pastor Alemão: para nada: depois de irem ao cu aos meninos, as desculpas não valem uma folha de papel higiénico. Merda para eles todos. A Parva Hílare, vulgo Clinton, monta a tenda “humanitária” histrionicamente: Irão etc. Parece um católico irrelevante chamado Guterres de volta dos refugiados, pobrezinhos, do mundo: dos de Lisboa, diz nada aos costumes. Está frio, porra. O remédio, sei-o bem, está nas leituras, no honesto estudo, na caneca de chá forte, no desprezo das menoridades todas. A cabal perfeição do gato. Rigor perfeito do gato como o de certa música e o de certos crepúsculos. Crescimento das aranhas e das unhas. Jornadas chaleiras de senhoras organizadoras de bazares de cómoda caridade (mas não em Lisboa nem na Polónia, que por aí se morre de frio e de “democracia”). Camponeses em sombra na encosta da serra. Animais apreensivos, em casebres de menos pedra que pau. O que se segue à ignorância é o esquecimento, o que se segue ao esquecimento é a ignorância. Claridade larga de uns olhos recordados: a mãe de Laurinda, minha tia aquela, esta minha prima dextra. Envelhecimento da árvore, mocidade dos ramos. O amor é mais fácil de curar do que a estupidez – e do que a maldade. Sonha que dorme levitando – e acorda repousado, retemperado, fresco, loução, como um noivo e como uma andorinha, aliás siameses também, como os empregados-de-mesa e os pinguins. Especializada, a maldade escolhe vítimas por escalão: etário, financeiro, sexual, rácio, político. Global, a todos fustiga. As ditaduras são exemplos superlativos da escumalha dita humana. Mas os patrõezinhos, os malcasados, os feitores, os assessores, os opinadores, os directórios, os encarregados, os infiéis-de-armazém – alinham na sabujice do mal pelo mal para o mal. Mediação, no corpo, dos aforismos atávicos-genealógicos. Da parteira ao pediatra, do psiquiatra ao coveiro. Beleza e verdade parecem-me indissociáveis: de onde seja feio mentir. André Maginot. Joseph Darnand, “herói” e traidor sem aspas justamente executado ainda em 1945. Maurice Gamelin. Jean-Paul Sartre. Oui, la Drôle de Guerre. Sopé das Ardenas. Mar do Norte. “The Washing of the Siegfried Line” – canta, canta, que já berras. Périgord e Charentes. O senhor Delano, lá tão longe do Champs de Mars, tão longe de Varsóvia – até soar a hora japonesa. Retalho ímpio do mundo. Floresta de Katyn, perto de Smolensk: fuzilamento de milhares de oficiais polacos por ordem de Stalin. Sikorski à procura deles, tarde de mais. Danzig já ficou para trás. Hans Frank, poder sobre vida e morte do povo polaco. Ciganos, judeus. Gueto de Lodz etc. Shoah. Marcha dos Granadeiros. Walther von Brauchitsch. Países Baixos, Bélgica, França. 8 de Novembro de 1939: correu mal o dia do primeiro atentado contra o Adolf. O sacana do Speer, que se safou à forca. Eva Braun, a putinha privada do monstro. August von Kageneck, um zé-ninguém da máquina de desfazer salsichas. Gaston Sirec, gaulês ao frio enquanto os nazis não chegam. A rata britânica fascista: Oswald Mosley. Os isolacionistas norte-americanos: Lindbergh, Ford, Kennedy Pai. Poesia belga de Émile Verhaeren: “(…) infinidade de uma estrada aberta (…) uma desgraça sem fim (…)”. Roterdão. Sedan: vocação de derrota. Rio Meuse. Heinz Guderian. Os Stukas no ar. Paul Reynaud. Marne. Aisne. Panzers. Dunkerque. Lapso e colapso. Maxime Weygand. A besta velha do Philippe Pétain. Dover. Vale do Ródano. Marselha. Córsega. Tunísia. Rouen. Bordeaux. Revivificação da Grande Prússia. O Loire. Rendição assinada por Huntzinger em Compiègne, na infame carruagem de 1918: 22 de Junho de 1940. Hotel du Parc, Vichy. Mers-el-Kebir, Argélia. Ilhas de Guernsey e Jersey. Home Guard. Crianças britânicas enviadas em êxodo para o campo. Richard Hillary. Spitfires. O porco do Adolf Galland, um dos aeronazis que ensaiaram em Espanha/Guernica a favor do cabrão do Franco. Werner Mölders. Varsóvia, 12 de Outubro de 1940 é dia de Yom Kippur. Rimas e ruínas: reconheço todas.

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Canzoada Assaltante