Quanto futuro (não) temos
A taxa oficial de desemprego ronda, à hora a que vos escrevo, os 10,8 por cento da população activa também oficial. Quero lá saber disso. Vem aí um mês inteirinho de mundial da bola. É certo que a selecção alegadamente nacional só vai durar três jogos, mas mesmo assim Sócrates e seus acólitos têm razões feriadas para curtir mais uma temporada à nossa pala, mesmo com este alegre tiro no pé desfechado a favor do poeta Alegre.
Tanto desemprego dá muito trabalho. Ou deveria dar. Mas como já não mandamos nisto (porque abdicámos de direitos e porque nos abstivemos de deveres), que se dane.
Onde agora moro, florescem os abates de fábricas e de lojas e de oficinas e de tudo o que outrora deu de comer a quem trabalhava. Em contrapartida, irrompem as grandes urbanizações quadriláteras a juros dispara(ta)dos. Grandes centros comerciais sobem do chão vários patamares para que o nosso insosso povinho tenha por onde passear sem poder comprar nada. A mocidade grafita as paredes, imit’hip-hops lá de fora e anda pelas ruas com as calças a expor o rebordo das cuecas e o traço longitudinal que de cima para baixo dá lugar ao apartamento das pernas. A velhice pasma nos centros de dia a alzheimerar ante a pimbalhada das televisões alegadamente nacionais. A maltosa de meia-idade, essa não sabe nem o que há-de fazer, nem como desfazer o que nunca deveria ter feito, isto é, abdicar sem luta de direitos e abster-se sem ética de deveres.
A coisa não está boa nem vai ficar melhor. Qualquer pequena ilusão só pode gerar desilusão ainda maior. Claro que nem pensar em revoluções. Já não temos educação cívica nem consciência crítica para uma atitude histórica dessa envergadura. Ou seja: já nem uma vassoura sabemos usar, neste tempo de aspiradores industriais.
Vale o mundial. Aqui onde moro, o gajo do café fia as minis e os tremoços, embora só por um mês, que é o exacto tempo que temos de futuro.
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