23/07/2021

PARNADA IDEMUNO - 669

 


669

Quinta-feira,
22 de Julho de 2021

    E a voz de Jon Anderson é ar tornado luz.
       Pessoas como ele dão de si a presença inicial.
    Rumo à simplificação – voluntária ou não. Estamos todos, vamos todos. É como ficar sem tanta carga, manter só a que conta. Menos livros, melhores leituras. Tenho-me referido a isso nestes papéis. Onde não houver barulho, onde correr água limpa. Ir por dicotomias negociáveis, expedientes práticos de sobrevivência.
    Em releitura, tantos anos depois, de mais um excelentíssimo livro de Armando Silva Carvalho (1938-2017): LISBOAS roteiro sentimental (Quetzal Editores, 2000). A folha-de-guarda do meu exemplar tem duas notas. A segunda é: Leitura integral no dia 20 de Janeiro de 2003. A primeira: Rua 52, Leiria. Pontos fora da língua. 25/XI/02. De facto, tinha ido ao hospital local para que me retirassem, com cuidadinhozão, os agrafos têxteis da dita língua. Sim, a língua-língua, este animal sangrento & molhado que nos ocupa a boca em multiformes actividades. Acontecia terem-me feito, dias poucos antes, uma biopsia. Um médico amigo, tendo topado que eu exibia uma esquisita coloração branca em redor de certa úlcera lingual que me vinha macerando o juízo, desconfiou. Desconfiando, mandou-me a ser biopsiado. Lá fui, de tomates pequeninos como ervilhas murchas. Não era cancerígeno. Era um dente que me moía a língua, sem que eu me apercebesse, na mecânica da mastigação. Arrancaram-me o dente, problema acabado. Nesse dia de me tirarem os pontos pós-biopsia, comemorei comprando o livro de A.S.C. O título é justo: trata-se de um conjunto de poemas centripetamente atraídos pela bela capital do nosso País. Começa assim:

    “Que estranha visão terá de ti
    o rio que passa
    e ao qual os poetas inutilmente oferecem
    areias de ouro e de Byron?
    (…)”

    Vamos já, portanto, em dois únicos: Jon Anderson (é ouvirem o homem, percebem logo de que estou falando) & Armando Silva Carvalho.
    Nem só de Beleza se nos mostra opípara a mesa. Todavia, digo. Após o jantar, comido na cozinha sem pressa nem grande demora, entretive o olhar na máquina-de-salsichar-burros, vulgo televisão-à-portuguesa. Merda em todos os canais lusíadas: merda de locução, merda de notícias, merda de uso da Língua, merda de assuntos, merda de moralidade(s), merda merda merda merda merda. Desliguei logo. Pus os phones e vai disto: os Yes interpretando Then (em 1970).

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Canzoada Assaltante