Souto, Casa, manhã de 28 de Fevereiro de 2009
Homens gabardinam como verticais apeados pássaros de cinza
por as avenidas fustigadas de ríspidos ventos quase marinhos.
A cidade é inclemente: é uma intempérie de pedra e gerações.
Nas casas de sacada alta, mulheres fulminam flores cáusticas,
pelas divisões fumiga o limão fervido em oxidadas caçarolas.
Estou daqui a ver tudo por dentro, é o trabalho a que me dou,
à falta de outra lotaria e de outro cinema.
Cabisbaixam-se as magérrimas árvores municipais, ao longo.
Das confeitarias, surde a intimidade do pão doce alaranjado
de ocultas mãos torcidas e rumorosas como búzios de segredo.
Quatro camisas muito vermelhas irmanam um varandim, de
que pende um olhar de criança doente além-vidraça. Nunca é
hoje, na cidade diagonal da visão. Brevíssimas epifanias rondam
os videntes cegos que nem acordeão tocam nem cão ladeiam.
E as rosas pesam como punhos de basalto, sobre uma renda calada.
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