26/04/2021

PARNADA IDEMUNO - 298

© Joel Meyerowitz


298

Domingo,
25 de Abril de 2021

    À luz crua, o mar obriga a semicerrar as pálpebras. A areia queima deliciosamente, apetece escavá-la, revirá-la até encontrar a húmida. Ainda não olho as raparigas, interessa-me jogar à bola até o banho se volver a melhor recompensa da vida. Calço 35, quase 36, espero chegar depressa ao 36 porque isso obriga a sapatilhas novas. Há outra coisa não menos deliciosa: imaginar que sei os nomes de toda a gente na praia. Não os verdadeiros, mas os que ela merece. O velho com cara de Cândido. O miúdo com sardas de Tomás. A menina de azul, Lua Maria. A Lídia Sol. O cabo-do-mar Venceslau como o ciclista. A mulher-dos-bolos, Adozinda. O grandalhão louro, Jack Morgan. O home’zito que está sempre a ler, Professor Baltazar. E eu, Billy.
    Pode que isto não passe de uma forma de futuro invertido. Uma recordação projectada antes de a memória ser accionada.
    É uma hipótese interessante. Já não calço menos de 42. Já olhei raparigas. Ainda atribuo nomenclaturas em barda. Quantos não estão de facto & deveras em um futuro-anterior? Naquela praia mesma, quantos? E já agora: e onde, que foi, aquela praia será?



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Canzoada Assaltante