25/09/2012

Tarde de ontem, manhã e tarde de hoje, terça-feira, 25 de Setembro de 2012


© DA, Leiria, 27 de Maio de 2012




10. ÁLEA-HORA

Leiria, tarde de segunda-feira, 24 de Setembro de 2012

Alisto-me no rol sozinho da hora, não preciso mais do que da hora minuto a minuto, nem de uma hora das outras de sessenta minutos dos outros preciso, preciso tão-só da hora-instante, momen’instan’tânea como a chuva e como o sol e como a lua e como aquelas árvores além todas de uma vez em álea, álea-hora não alheia.
Não me dedico a criar santorros nem coisas deusas dessas. A única mi(s)tificação a que procedo – é a da minuta do minuto, a acta do perpétuo contra a autoridade do efémero. Isto é nada, isto é fortuna. É o que puder.

11. DESCIDA GERAL

Leiria, manhã de terça-feira, 25 de Setembro de 2012

Descida geral da temperatura de Norte a Sul do País: prevista, anunciada e cumprida. Céus menos cristalin’ítidos, também. A manhã remoça-se sempre, é verdade, dona de infinita cosmética. Significa que as janelas ainda abrem laranjeiras e que as veras rosas-de-todo-o-ano são (serão sempre) as mulheres.
Há quem sofra disto de a Vida não ser sempre Verão. Eu não. Devo ter sorte, nesse aspecto. Agrada-me que o mundo pareça retrair-se em pensamento, que semelhe ponderar o que anda, ele-mesmo, a fazer no mundo.

12. UM TEMPO ASSIM

Leiria, tarde de terça-feira, 25 de Setembro de 2012

I

Sobreviemos no Outono
Sobrevivemos ao Verão
Subvenientes do Sono
Que é a nossa condição.

II

Tal a pomba se alimenta do chão, assim
nós.

III

O nada não é portanto a ausência das coisas
mas a do sujeito.

IV

A Língua mostrando-nos acém,
dizendo-nos isso assim:
carne, breve pó, luz só nossa, além,
além-longe-álea, adeus, sim?

V

Chove, finalmente chove no mundo, que por tal
volta a parecer-se com o mundo de quando a
Mãe me esperava em casa a horas civis,
mundo-portal da casa-dos-vivos manejando
chávenas, dedais, tesouras, escovas, lápis,
chove-se a fibra agreste quase ao ar-livre,
as ruas, açuladas do quase-gelo, tremem
como crianças longitudinais deitadas,
há muito tempo que esperava isto, em casa
o porte do chá espera como uma mãe-termos,
uma Mãe
termos,
não temos,
olha o que chove.

VI

Olhados campos molhados sendo mundo:
podemos ser – perten-ser – deles.
Quando, de dentro do casaco, olho a possibilidade:
vejo-a (m)olhada, em evasão-encontro.

Poeirada de água: pluvial primeiro, fluvial depois.
E então: uma só maneira, que é ser vivo.
Quanto homem primitivo se ergue na voz
deste Basílio electricista estralejando a seda

do chapéu-de-chuva à porta da oficina,
batendo as plantas das botas no cimento verde,
atirando palavrões grossos como punhos

ao aprendiz que, a um canto, a cabeça
aureolada do candeeiro amarelo-torrado,
pensa como voltar de motorizada a casa com

um tempo assim.

VII

A esta hora as praias desertas agora.
A esta praia as horas agora desertas.
O deserto espraiando ora a hora,
agora as coisas mais incertas.

2 comentários:

olinda Rafael disse...

Escreves muito bem!
Costumo vir espreitar sem deixar comentário.
Parabéns!

Daniel Abrunheiro disse...

Obrigado, muito obrigado, Olinda.

Canzoada Assaltante