A tristeza de
Cristiano Ronaldo e a nossa
Pica-se miudinha como o Messi a cebola a alourar
com dente de alho, folha de louro e meia malagueta das rijas. Esparge-se o lote
de cubos de vaca não desprovida de um quase-nada de fímbria sebo-gorda. Esburga-se
o tutano ao osso vacum e deita-se-o lá pa’ dentro. Chora-se uma mijinha de
vinho branco no tacho (sacudir no fim porque a botelha não sabe fungar).
Espera-se o desenrolar ígneo da coisa bebericando uma taça do mesmo brancolas,
que ontem se deixou ao fresco da varanda enrolado em peúga lavada e demolhada.
Quando se topar que a carniça já chia, bota-se arroz do agulha. Queimar não se
deixa, ourar é que sim. Tomate picado então. Se possível, do de coração-de-boi,
do de estufa não, que sabe a nada. Colherdepaular o refogado. Ervilhar a
contento. Deixar suar o compósito. Um cachito de água morna melhorada pela
infusão prévia de bacalhau, um nadinha dele para especioso contraste marinho da
vaca abatida à nórdica. Meia colherita-de-chá de açúcar: a ervilha gosta deste
truque aprendido nas mães. Beber outra tacita de branco frio enquanto a mulher
está ao telefone. Ir fritando finas fatias de pão branco com alho picado
miudinho à Messi e orégãos em azeite produzido pela humanidade alentejana ao
lume baixinho e bom como o Messi. Não pensar na vida nem no Vítor Gaspar.
Amandar-lhe com mais um branquinho, que a vida são dois dias mas os decilitros são
três. Sintonizar o rádio da cozinha na Antena 2 enquanto o Relvas não acaba com
ela. Telefonar à dona Dolores Aveiro a sossegá-la quanto àquilo do filho não
ser tristeza de maior mas sim de júnior da vida, que em sendo preciso a Irina
sempre lhe empresta um milhão ou quatro. Desligar a rosa do gás e abafar.
Acabar o branco e encetar a de vermute que o Lídio da Graciete deixou cá quando
foi pelos anos do cachopo. Copinhar um cálice dele com raspa de limão
perfurador à Messi e um coice de gin do Beefeaters ou, não havendo dele, do
Bombay Sapphire, ou, para mal dos nossos pecados, do Gordon’s ou do Larios,
essa chilra genebra dos pobrezinhos. À saúde do CR7 e das gajas boas, enquanto
a mulher nunca mais acaba a converseta com a Irene dos Moldes Semedo Unipessoal
Marinha Grande junto à Rotunda do Vidreiro. Servir a pratada na louça azul do
enxoval. Rechupar a papel-algodão o azeite panificador da fritura. Abrir o
tinto de Murça à saúde da Porca do mesmo transmontano sítio. Amandar-lhe logo
com um pr’atestar. Continuar a não pensar nem no Vítor Messi nem no Cristiano
Gaspar. Reticenciar de azeitonas lusitanas a malguinha de barro vermelho e
exclamar pickles ao vinagrete a de esmalte inox. Alpistar o canário, reiterar o
Murça rebrindando à santa Porca, desligar o rádio e ver o resumo do
Barcelona-Real de sábado passado, confirmando que o Messi é a perder de vista
muito melhor do que o Cristiano, só não é melhor do que a russa, a Irina, que
ele também não há milagres. Saber que o CR7 já sabia que a prima-direita dele,
a coisa, ia para a Casa dos Segredos.
À cautela, ir abrindo outra Porca de Murça enquanto a ervilha refresca e o
arroz se não solta. Saber que nenhum golo do cachopo madeirense vale mais do
que um gole desta pomada de atrás-dos-montes. Decidir mandar pró facebook do
Ronaldo uma mensagem a dizer-lhe que ele há bué d’abismos de diferença entre estar
triste e ser um triste. Esperar que a Irene dos moldes nos largue a mulher e
que a Irina não o largue a ele, caso contrário então é que ele saberia o quão
portuguesa é a rima com tristeza, mais milhão menos milhão.
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