ACALORADA ZOOLOGIA
Leiria, tarde de quarta-feira, 5 de Setembro
de 2012
Respirar é uma incandescência, por estes
dias de implacável vaga de calor. Heatwave
– como dizem alguns estranjas. Anseio pelo que já houve, já não há nem parece
que volte a haver, a saber: o Outono. A global conspurcação de Terra & Céu
levou ao maniqueísmo da meteorologia: calor de mais ou frio de mais. Goraram-se
Outono e Primavera. Escrevi ontem, para que saia amanhã nO Ribatejo, uma crónica pró-bombeira e antipolíticos. Hoje, que me
não há crónica em progresso, cronico o abatimento da vontade, derretida e suada
ela pela fornalha insensata do Setembro. Vale-me a progressiva leitura da
biografia de Gabo por Gerald Martin (Gabriel
García Márquez). Ainda por cima – e apesar de me não ter hoje levantado tão
cedo quão de costume – uma soneira pasmacenta entorpece-me o saco de ossos
& moles febras. Contr’ataco a lesmice a café forte e chapadas de água na
tabuleta das ventas. Mas neste desanim’estado não posso versos, nem dos
compridos e chatos nem dos chatos e mínimos. Uma porra, a caloraça. A única
virtude dela é o moderado strip-tease das senhoras pelas ruas desérticas: pérolas
de luz-pele no estojo-veludo do ar
vidrado.
De tais senhoras mana a zoologia gráfica
que, ao tempo mesmo, as une e torna diversas:
de uma, rompe a égua segura e nervosa (sem
oxímoro), os cascos quase nus cloc’cloc’and’andando passadas boas para campos
de musgo em longes de alfafa;
de outra, a corça à frágil força toda: do
susto líquido dos olhos aos dentes quase carnívoros – e sardas de camuflagem
bosquímana;
daquela,
o cisne farto volteando esteiras de água verde (as redondezas íntimas em
vestido dessa cor [l]aquática);
daqueloutra, a beluga de largos
toucinhos brancos flanqueando cicatrizes de desquites vergastados não
tranquilos e não vergastados há muito.
Quanto aos machos, nada a dizer: como
de costume, ou não existem, ou estão a desfazer-se de plasma na sesta
existencial que os tira do que escrevo do que mos traz a aguar a égua, a cursar
a corça, a cismar à cisne ou a blogar a beluga pelo facebook em casa, que é
afinal onde, cerrados os estores à cal(ma) abrasiva da tarde, se está bem, ou
do que aqui menos mal, obrigado.
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