XARÁ
Leiria, manhã de terça-feira, 11 de Setembro
de 2012
– A imaginação
dispara logo.
É
a frase que ouço três mesas além. Dois cavalheiros limpos que conversam, um de
pé, sentado o mais velho. À despedida, o da frase disparada chama Daniel ao outro. O homem da Rita é
Daniel também. E quando fui buscar café ao balcão, a Rita assim para uma Lena:
– Então e o teu
Daniel ’tá bom?
E
a tal Lena:
– Lá vai andando.
Atão e o teu?
De
modo que me sinto xará de cavalheiros com quem não trato verbalmente, à
excepção do gentil e discreto marido da Rita.
A
manhã por ela mesma é todavia o meu assunto. Vai por enquanto fresca, a
undécima deste Setembro (39 anos do golpe CIA-Pinochet em Santiago do Chile; e
que se lixem as Twin Towers de há onze). Daqui a pouco vou comprar um lápis,
acção que me agrada muito (mas tanto) há mais de quarenta anos. A loja a que
vou é servida por uma jovem senhora: bonita, muito bonita, bem nascida de
formas e dicção, roupinha tratada, uma quase timidez de água quase verde subida
aos olhos. Quando há mais fregueses, toco os cadernos expostos, desejando
tê-los já escrito a todos. Não sei que espécie de cadernos os outros Daniéis do
bairro escreverão com que espécie de lápis. Alguns serão, mesmo que não de
papel e sentada literatura como a minha. Serão ou não, não sei, como serão ou não
nossos netos os filhos dos filhos a que chamamos nossos.
(Casas,
casais, quintas, quintais: vejo e passo, sem abrir os olhos nem sair do sítio.
Pratico a vida como a uma espécie de sono.)
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