12/03/2010

Rosário Breve nº 146 - www.oribatejo.pt

Uma só sílaba de cada vez

Os gestores públicos do País vencem salários tão obscenos, que não deveriam ser pagos em euros mas em revistas e dêvêdês pornográficos. Nessas revistas e nesses filmes, nós, contribuintes de pé-descalço até ao pescoço, faríamos, como aliás já fazemos e sempre fizemos, de senhoras com falas reduzidas ao gemido monossilábico. E eles continuariam, como continuam, a fazer de garanhões financeiros.
Assim decidi começar a crónica de hoje: falando de porcarias sem recorrer a um único palavrão – à excepção de dois: “gestor” e “público”. Em princípio, não devo ir malhar com os ossos a tribunal por causa deste auspicioso exórdio. Os tribunais deixaram de ser para a arraia-miúda que faz as alegrias dos paginadores do Correio da Manhã. (Vou reformular a frase anterior cortando-a: “Os tribunais deixaram de ser.” Muito melhor, não ficou?)
Eu era para vos encher o saco com psicopedagogias a propósito do inglesismo da moda, o “bullying”. Ná. Toda a gente sabe que o “bullying” é o exame de código para quem anda a tirar a carta de “carjacking”. E que só há “bullying” por causa de um tal aparelhómetro cor-de-rosa chamado Magalhães. E de “bullying” estamos falados.
A minha perplexidade, que julgo vossa também, é simples de formular – Mas que raio é isto tudo? Milhares de pessoas são postas na rua porque as fábricas fecham a pretexto de falências tão manhosas como licenciaturas tiradas a um domingo de Agosto. Os impostos não sobem, os aumentos é que vão ser fixados abaixo da inflação. O têgêvê já não arranca porque os milhões estoirados em “estudos” para o aeroporto não permitem mafiar mais brasileiros para a selecção “nacional”. E até a chuva diluviana deste interminável Inverno já imita, em consequências práticas, os efeitos de tanta e tão pornográfica e tão sucateira falcatrua.
Resta-nos isto: gemer mui guturalmente, e de olhos semicerrados como se estivéssemos a gostar muito, uma sílaba de cada vez.




1 comentário:

Manuel da Mata disse...

...e essas sílabas podiam ser uma só repetida muitas vezes. Assim: ai...! ai...! ai...!
Abraço.

Canzoada Assaltante