© John Singer Sargent – Corfu: the Terrace (1909)
Souto, Casa, noite de 5 de Março de 2010
Maviosos me surgem imaginados arabescos vegetais
Viver é quanto nos resta de havermos nascido
Toda a casa é capaz do ouro como do estrume
As vidas como os restaurantes de berma-estrada
São para perpétua abertura até que caia a cal
Uma brisa levantar-se tenta do chão qual ferida ave
Sonho muito com a neve ninguém em torno
Translúcidos peixes dos trópicos em coloratura
Manam de sopranas vozes a leste além do mar
Sensato é matar a lápis os borborigmos da Língua
A economia está na base da prostituição
A prostituição na da religião graças a deus
Prostíbulos e igrejas partilham velas e linhos
Se fosse hoje o senhor Bach não teria tantos filhos
Nem tanto comporia retendo vinte por cento na fonte
De alguns antepassados repito o passar o Terreiro da Erva
A cheirar os fritos pobres dos lares de vinagre
Imolando a frescura das sílabas à vã coimbridade
Subindo a Montarroio a Celas aos Olivais
Cansado aquando à do Brasil até à Navarro
O pão volve-se lenha que pão foi depois de terra
É-se em solidão bizantino e insignificante
Muitas vezes me tenho acolhido à sombra de plátanos
Festejando a cabeça de um cão ou um rumor de cegonhas
Toco o meu saco que não contém já a infância de ninguém
E no entanto manhãs hão-de perfumar a luz
Mercê do ofício das árvores e das aves a ferir.
1 comentário:
Grande, grande poema!
O remate luminoso-optimista lembra-me Woody Allen (talvez em "Annie Hall"): duas velhas queixam-se, num restaurante onde vão sempre jantar, da má qualidade dos bifes. Uma delas remata a consensual crítica: "E, ainda por cima, os bifes são sempre tão pequenos!..."
Abraço.
JJC
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