07/09/2009

Nox


Souto, Casa, noite de 7 de Setembro de 2009

As estrelas trabalham lá fora, em casa frita-se peixe, rega-se as plantas, a brisa dá de leve nos cortinados. Movimentos pendulares tem o coração físico, trabalhador ele também. A noite é nova, rapariga antiga perfumada de pobres jóias. Um momento para aceitar o que vem quando vier. Ofício grave, a aceitação. Tem a ver com as esquinas futuras, as porvenientes outonações dos anos feitos corpo.

De longe recebo luzes, vozes. Chegam do que é mundo, amortecidas no espectro, graves também. Costumo supor presenças, pés nus escrevendo areais. Ontem vi o mar. De espuma, geração espontânea de gaivotas: cruzes de sal na abcissa azul. Um barzinho sazonal vendia copos de café. A jornada tinha sal. Pinheiros florestavam a respiração. Depois, estrada, o cedro, a casa. Pude reconciliar-me com o sono, pude receber vozes, luzes. Não todas, porém, do plano dito real.

Consulto imagens que remetem para a solidão fundamental dos nascidos. O trabalho vigora: nomes, datas, dimensões, ícones, sentimentos, rejeições, chávenas e pires. Mulher de nome Graça, carpinteiro de nome Armindo. Ano 1973, ela. 1959, ele. Algures na noite do mundo, uma e outro. Casas com anexos viveiros para animais alimentícios. Leiras abandonadas pela emigração. Candeeiros a petróleo, ainda, muitos. Formigação ubíqua de políticos com seus acólitos. Cronistas, electricistas, copistas, gondoleiros. Melros, cágados, patos, jibóias. Mulher de nome Selma, pedreiro de nome Diamantino. No mundo da noite. 1962. 1951.

Sentado aqui por enquanto, atento, tonto, português. Capaz de ramificar sentidos ilusórios com a caneta, pensador pendular de vielas e fragmentos frásticos, sílabas como dentes de ouro, tirador de água – e florestador, eu também, como o coração e o sal e Graça e Selma e Armindo e Diamantino.

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Canzoada Assaltante