© DA., Sr.
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Domingo,
13 de Junho de 2021
Este é o caminho, hei só que segui-lo afora.
Caminho não é masculino de caminha.
É rectilíneo labirinto, torta recta.
É o que de trás era já porvir.
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Às seis da manhã, primeiro pão para os primeiros pardais do dia. É momento da mais segura alegria. O prazer de estar vivo toma-me o instante, que não regateio à escrita. Lavada da intempérie do entardenoitecer de ontem, a terra corisca de saúde aeróbica. À marquise, atirado já o pão mole, conto os pardalitos. As pombas não tardarão, atraídas pelo fervilhar dos pequenitos.
Antes dos pardais, vi o corvo.
Era um fragmento alado da noite acabada.
Vive no bosquete, tinta móvel nigérrima.
Muito belo, velho talvez, conhece o Tempo.
Não é comum dar-se por visível.
É meu privilégio mirá-lo na alva fresca.
Traço o corvo negro com lápis amarelo.
Tento inscrever-me o Tempo dele, escrevendo-o.
Às vezes, ele é vários – como Pessoa.
Aos domesticados, baptizam-nos Vicentes.
Este é porém, como Ferré, sem dieu nem maître.
O meu é de si só.
Em perfeito silêncio o contemplo da marquise.
Nobre como uma atitude rara.
Ele sim dono de si, mestre da solidão.
Nenhum dos versos (chamemo-lhes versos, vá) acima alinhavados pretende fazer do seu redactor um portador de candura seráfica, um anjo hipersensível, um falso dado a falsetes. É (sou) mais simples: em menino, fui feliz sem necessidade de estímulo, motivo ou justificação; agora, sou-o quando me levanto cedo & tenho pão para dar à passarada indomesticada. É beleza, pronto. O lápis amarelo funciona, esta é uma manhã feliz. Organizei os livros em trânsito ledor, esperam-me horas de enriquecimento vinculativa carga fiscal – sem contas a prestar, portanto: nem ao Estado, nem a medíocres.
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