para a Mariana, uma das minhas raras luzes
1. A boca molhada – a boca erótica
– é a mesma que levamos
a casamentos, baptizados
e funerais.
2. Vamos todos pensar – a Felicidade.
Se não pensarmos – a felicidade.
3. No escuro a mão toca a rosa negra
– a cabeça amante.
4. O sangue e o leite
por uma perna a baixo.
5. O coração é inconsútil.
E ázimo.
6. Só sonho antes
de me deitar.
7. O telefonema que conta uma morte
– a pequenina euforia da voz.
8. A dignidade é um atletismo:
corre, coelho, corre.
9. O sorriso do calculista:
– dentes de fita métrica.
10. A nossa mulher vai com outro
– torna nosso o outro.
11. Sentado num muro ao sol
– vou morrer sem ti.
12. Música e bailarinas espumantes
incendeiam a noite psicadélica.
13. Um homem leva o cansaço à fonte
– bebe como um menino.
14. Dá-me um prato de sopa
e deixa ficar a mão.
15. Já dormi com uma mulher.
Ela via-me dormir, a minha irmã.
16. O leite faz-se pedra
– já nascemos apedrejados.
17. Mancha de sangue na estrada
– levaram o corpo mas deixaram
a vida.
18. Beatitude.
De boi atitude.
19. Solto na praia os meus dois mortos
como a papagaios de papel-de-seda.
20. Já tenho mais terças-feiras
do que futuro.
21. Mulher sentada em carro chorando.
O telefone à mão, longe.
22. Sentado num muro ao sol
– não re(a)verei o mar.
23. Dos amores velhos fiz uma lista telefónica.
Não tem nomes nem números.
24. Chovem guarda-chuvas a pique.
Em terra tornam-se homens velhos.
25. Jantamos pão com azeitonas.
Ouvimos a Lua.
26. E de repente, quando nada o fazia prever, uma prosa. Falei hoje ao telefone com a minha Mãe. É sempre outro século que fala comigo, quando me fala ela. Ela é do Outono de 1924. Ela já foi uma menina. Depois fez amor com um homem da Primavera de 1917 e multiplicou-o. Ela permaneceu una e indivisa: uma existência geológica. Calculou milhares de tostões. Recorreu a enchidos para nutrir os galgos. Está sozinha na casa dela. Nem sempre reconhece. Ainda toma café. Traz aparas de fiambre para os gatos. Às vezes, lembra-se e telefona. Depois senta-se no século dela, imune ao Outono deste.
27. A minha vida é feita de beleza.
28. Eu escrevo versos.
Aqui está outro.
29. Esse soluço antes de explodir.
O regresso à base em silêncio.
30. Esquecer dá mais trabalho
do que amar.
31. Recebe, do sexo,
o coração o vento suão.
– é a mesma que levamos
a casamentos, baptizados
e funerais.
2. Vamos todos pensar – a Felicidade.
Se não pensarmos – a felicidade.
3. No escuro a mão toca a rosa negra
– a cabeça amante.
4. O sangue e o leite
por uma perna a baixo.
5. O coração é inconsútil.
E ázimo.
6. Só sonho antes
de me deitar.
7. O telefonema que conta uma morte
– a pequenina euforia da voz.
8. A dignidade é um atletismo:
corre, coelho, corre.
9. O sorriso do calculista:
– dentes de fita métrica.
10. A nossa mulher vai com outro
– torna nosso o outro.
11. Sentado num muro ao sol
– vou morrer sem ti.
12. Música e bailarinas espumantes
incendeiam a noite psicadélica.
13. Um homem leva o cansaço à fonte
– bebe como um menino.
14. Dá-me um prato de sopa
e deixa ficar a mão.
15. Já dormi com uma mulher.
Ela via-me dormir, a minha irmã.
16. O leite faz-se pedra
– já nascemos apedrejados.
17. Mancha de sangue na estrada
– levaram o corpo mas deixaram
a vida.
18. Beatitude.
De boi atitude.
19. Solto na praia os meus dois mortos
como a papagaios de papel-de-seda.
20. Já tenho mais terças-feiras
do que futuro.
21. Mulher sentada em carro chorando.
O telefone à mão, longe.
22. Sentado num muro ao sol
– não re(a)verei o mar.
23. Dos amores velhos fiz uma lista telefónica.
Não tem nomes nem números.
24. Chovem guarda-chuvas a pique.
Em terra tornam-se homens velhos.
25. Jantamos pão com azeitonas.
Ouvimos a Lua.
26. E de repente, quando nada o fazia prever, uma prosa. Falei hoje ao telefone com a minha Mãe. É sempre outro século que fala comigo, quando me fala ela. Ela é do Outono de 1924. Ela já foi uma menina. Depois fez amor com um homem da Primavera de 1917 e multiplicou-o. Ela permaneceu una e indivisa: uma existência geológica. Calculou milhares de tostões. Recorreu a enchidos para nutrir os galgos. Está sozinha na casa dela. Nem sempre reconhece. Ainda toma café. Traz aparas de fiambre para os gatos. Às vezes, lembra-se e telefona. Depois senta-se no século dela, imune ao Outono deste.
27. A minha vida é feita de beleza.
28. Eu escrevo versos.
Aqui está outro.
29. Esse soluço antes de explodir.
O regresso à base em silêncio.
30. Esquecer dá mais trabalho
do que amar.
31. Recebe, do sexo,
o coração o vento suão.
Caramulo, anoitecer de 20 de Setembro de 2006
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