01/08/2022

H. EM BUSCA DELFIM - 29 a 32

© DA.


29

 

Excelso Delfim:

 

Está de volta a caloraça. Amodorro os meus dias vácuos lendo o mais que posso. Olho as coisas – mas vejo-as pouco. Homens opinam a guerra russo-ucraniana ante rodadas de cerveja regularmente municiadas. Noto que recordo menos. A incerteza do presente impôs-se-me – e não me liberta. Ando muito, quilómetros a fio em perfeita singeleza. Repito circuitos como rato em roda-circulatória de laboratório. Como sabes, prefiro os dias frios. Nem isso tenho.

 

30

 

Aconteceu-me hoje: conversar com pessoas.

Escutei mais do que proferi, valha a verdade.

Pelo entardenoitecer, o desamparo retomou-me.

Alimentei dois gatos & três pombas.

Escolhi um assento abrigado pela sombra.

Em mangas-de-camisa, redijo ora a lápis.

Espero nada como espero ninguém.

Falam de calor mais alto para o fim-de-semana.

Faço anos no Domingo, 8, às oito da manhã.

 

31

 

A minha vida tornou-se um domingo interminável de lojas encerradas em ruas desertas. Tornei-me mais de perder do que de achar.

 

32

 

O homem que a meu lado, ao balcão do Cruz, tomava café – caiu de lado sem aviso. Aflição geral. Bateu duramente com a cabeça no soalho. Virei-o de lado, chamou-se de imediato o 112. Recuperou devagar, depois de ter vomitado a canja que acabara de ingerir. João M.L.S., de Chafé, Viana do Castelo, peregrino a sós rumo a Fátima. Toda a cena foi deveras angustiosa. Conto ir hoje saber dele lá ao Cruz. A coisa aconteceu ontem. Eu acabara de dar uma volta solitária pelo Choupal. O calor era violento.

No sábado, perdi (uma vez mais) os óculos bons. Escrevo agora com uns de compensação. Não sei como ou quando reaverei lentes-progressivas: são caríssimas, não tenho tusto.



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Canzoada Assaltante