© Edward Weston
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Isto, ou há gente
a mais no mundo – ou mundo a menos. O planeta está tipo-espécie-à-guisa-de-Cidade-do-México-Global.
Inundações além, secas prolongadas acolém. Quarenta graus em Helsínquia,
tiritando-se de briol em El Alamein. Muita gente por decímetro-quadrado, deserto
interior em cada indivíduo condenado à autoconsciência.
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Delfim, boníssimo
Delfim:
Quanto percepciono,
e bem mais do que nos meus antigamentes, percepciono-o em reiteração. Os seres
estropiados, sabes? Os estropiados seres de Coimbra que pelo entardenoitecer,
em andaina, se colmeiam em favo à porta dos institutos de caridade (este último
substantivo, uso-o eu – pois que solidariedade é mais politicamente-correcto).
Zumbem em surdina os traficantes, os passados, as prostitutas, os cegos de
trevas duplicadas, os romenos (filhos todos do Ceausescu), os todos, enfim, que
vieram para esta Hollywo’odida-Torre-Cabra. A minha recente rotina laboral
torna-mos (ainda) mais visíveis, mais evidentes, mais preclaros – mais me-próximos,
vá. Junho não ajuda. Hoje, a luz foi de cartão-de-caixa-de-sapatos. Às sete da
manhã, morrinhava molhatolamente. Depois, encalorou-se a coisa. Desandamos nisto.
Eu sei bem que bem percepcionas quanto te digo desta Coimbra que, por 1-23 (ou
seja: um ano e vinte-&-três-dias), é mais tua do que minha.
Ou então:
Nem só de
veias empoeiradas.
Também a
praga turística, loira ou china.
Subevenires de cortiça +
galo-de-Barcelos.
E o
desemprego-índio: em-flecha.
Bibelótes da modernidade,
hambuporcoarias.
Alface tisnada,
vinho-de-cozinha-ao-pacote.
Os que dormem
na rua.
Os que, tendo
casa, sofrem de insónia.
Absinto-logo-(d)existo.
Compenso-logo-(r)existo.
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A trepidante
aventura hodierna de Hermínio é a seguinte: dar amostra de sangue para análise.
A doutora recebê-lo-á ao dia 17 próximo. Já H. se encontra na sala-de-espera
dos analisandos. Não gosta que o piquem e/ou sangrem, pois não – mas tem de ser, a-bem-da-nação. O espaço (luminoso & ventilado, nada que se lhe aponte de
negativo) está bem fornecido de esperantes. Um de tais bípedes é um ser do
género fêmeo cuja pele, de retinta cor-de-azeitona, reverbera à contraluz. Outro
deles, fêmeo também, é de fúlgida cor-de-claras-batidas-em-castelo. Os restantes
23 primam pela morenidão adamada, meridional, vim há dois dias da Figueira
& ainda me acho iodado. Alguns velhos (& H. entre os quais, sim, já).
Alguns aí por seus/deles quarentas. Criança nenhuma. O ar-condicionado funciona.
O chão está limpo. Respeita-se o silêncio. Não há, felizmente, televisor aceso
ou por acender. Um pátio coberto em estufa alberga flores, vê-se pelas vidraças
quadrangulares. Toda a gente mascarada. Como esta praga veio da China, talvez
seja mais assisado escrever: Maoscarada. Hermínio faz por não ceder ao
tédio. Tem pavor ao tédio – bem mais do que à morte mesma. Lê o seu Fuentes/Nonato.
Tem duas saquetas de açúcar para chupar depois de o vampirizarem. Trepidante
açúcar, desmedid’aventura.
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O grande
calor acossa-nos, transumantes respirando a custo.
À sombra, se
alguma brisa, viver é ainda possível: e justo.
Junho, que
Teixeira-Gomes inventariou, é juncofumegante.
Vibram de
sede as rosas, que as não visita chuva aquém-adiante.
Esperam-me turnos
nocturnos apenas, a-deus-graças.
Zombiear-me-ei
à claridade cegante, aposto.
Andamos de máscara,
as tipo chino-mordaças.
Ganharei pela
noite o pão do meu rosto.
Quinta-feira,
hei visto mundo, dei veia à enfermeira.
Depois,
autocarreei-me, fui ter com o meu Gato.
São quase as
dezanove, está calor, já não chove. E em retrato,
eu vi lírios
brancos, brancos qual cal em fogueira.
Remo contra
mais marés do que marinheiros.
Suo minhas
estopinhas em prol das sopinhas.
Só custo uma
libra, dois xelins, três dinheiros.
E comovo-me,
às vezes, pensando nas Filhinhas.
Pessoas – a que
assisto como a espectáculos sem gala.
Animais –
deles a militante inocência, a rigor sem pecado.
O burro de em
frente & a vaca de ao lado.
Acedi a gente
acedendo à fala.
Já se vai torresmando
o Sol a seu poente.
As
paragens-bus? Apinhadas de gente.
Amanhã, por
feriado, é serôdio domingo.
Conto almoçar
o meu pão, de vinho um pingo.
O grande
calor
Etc.
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Acalma-se entretanto a hora, não dói ou macera tanto estar vivo em perene cont(r)a-corrente. Cervejófilos crepusculam a sua folga – muitos trabalharam deveras través a canicular-mordente jornada. Tremoços (= “camarões-do-Eusébio”), amendoins. Crianças coca-coláceas. Um gato ao longe farejando moitas que os ratos desabitaram a tempo. Delfim, magno Delfim: antes que de vez se nos imponha a senectude – ou de repente a trombose-fulminante –, será talvez de melhor grado o usufruto de horas-destas-assim-tal-esta. O mini-super fecha daqui a pouco, recolherão cansadas a casa suas obreiras a salário-mínimo. Nenhumas (lhes/nos) são, as horas, extraordinárias. Assim é para quase todos.
Acalma-se
entretanto
Etc.
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