Um fervor de pássaros orquideando os ares:
a chuva.
A caspa dos anjos pelas ruas da amargura: o
granizo.
Os casais fricativos fazendo-se filhos: os
êmbolos.
Um tesouro derramado que ninguém demanda: o
Outono.
A mão do velho: a luva.
A covardia obrigatória: o juízo.
Os ajuizados: os trémulos.
A diária morte: o sono.
*
Ao frio dos domingos coalham os gestos.
Só o antigamente é real por vezes.
Vozes espadanam barbatanas acústicas no
éter.
E a devastação sideral nem sempre é
consolo.
*
POEMA
DE ALGUM VOCABULÁRIO
DE
FERNÃO
LOPES
COLIGIDO
E EXPLICADO POR
MARIA
EMA TARRACHA FERREIRA
Acordo lembrança em ideia,
se a fundo abaixo por baixo.
Avisado sabedor,
azo ocasião por causa de esmo orientação.
Asinha balasarte, depressa espécie de
cutelo,
apraza caça barvacã muro fora das muralhas
e mais baixo do que elas.
Carracom carracão antigo e de longo curso
navio cata busca cobro querelando-se da
mercê.
À angustura, dita danosa áscuma,
a dona empacha o departido.
E o fruito muito, fruto de estonces,
fiúza não folga em toda guisa.
Lavrador de Vénus amavioso,
porque (si, prougue) toste talante e
fremoso.
Ousio queda. Bever, bebe.
É o abastante.
*
Aqui somos pois profanamente
como toda a gente.
Ganhar-se um tostão e perder-se
irremediavelmente
como toda a gente.
(Gostaria, por vezes, de não pensar no
pensar.
De, atirada a água à linha, não morar no
peixe.)
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