Os dentes de Berlusconi
Sempre tive inveja dos dentes de Berlusconi. Deixei de ter.
Devo dizer que não gostei das infinitamente repetidas imagens da agressão de que o superpadrinho italiano foi alvo. São frias, rápidas, ríspidas, vermelhas de mais até para um benfiquista dos mais agarrados. A violência é sempre insensata e mal fundamentada. Não era assim que Berlusconi deveria ficar com os dentes partidos. Era metaforicamente. Pela força da Lei, por exemplo, se ele não estivesse tão acima dela. Não era com uma estatueta brandida por um alegado deficiente mental com quem tanta mas tanta gente silenciosamente se solidarizou (sobretudo portuguesa, mudada a figura).
Nada disto tem a ver com as orgias e os desmandos sexuais do cavaliere. A mim, essas coisas não dizem nada. Antes isso do que andar na droga. O megaplutocrata italiano gosta muito de se dourar ao sol cercado por jovens pouco vestidas junto a piscinas de um azul mediterrânico. Que as jovens sejam pagas pelo erário público ou pelas contas-correntes de um tipo que só por graça quereríamos como primeiro-ministro (ou não?...), é indiferente, visto ser ele o dono e senhor daquela coisa (nostra…) toda.
Ainda bem que por cá não fazemos nada disto. Os já célebres episódios de Mário Soares na Marinha Grande, de Vital Moreira não sei onde e de Francisco Assis em Felgueiras – são excepções aliás brandas. Foi só fumaça, para parafrasear o inenarrável Pinheiro de Azevedo de outros tempos.
Por cá, quem anda de boca partida e nariz à banda são os desempregados e os mal empregados. É a mulher mal descasada cujo antigo macho cumpre a ameaça final da facada e da caçadeirada. É o idoso que teve a má ideia de envelhecer num país que não é nem para velhos nem para crianças nem para ninguém que se não saiba armandovarar a tempo.
Para Berlusconi, chegou a hora do dente por dente.
Para nós, ainda não chegou a do olho por olho.
1 comentário:
Pertinente e com génio. Abraço
Enviar um comentário