© Jerry Uelsmann
Untitled (1975)
Souto, Casa, tarde de 23 de Dezembro de 2009
Deita-se o corpo como a um bidon
dentro ladra o cão do coração acorrentado
num pátio à lua se vive em pensamento
não tem nada que saber o viver
um pouco antes do sono a desatenção possível à mente mesma
o sossego das jarras favorece o estertor das flores
retratos decapitados pacificam enfim as famílias
outra gente ocupará estas casas, estas ruas, aqueles tempos
oscila-se um pouco entre ferreira de castro e os ten years after
entre o dicionário da lello e a pagela do professor doutor elysio de moura
nascido em braga a 30-8-1877, falecido em coimbra a 18-6-1977
entre o foucault dos blusões de cabedal e o tarantino da pam grier
a tarde é um túnel breve, melhor seguir de faróis acesos
até a próxima estação de serviço, a próxima vida
dentro ladra o cão do coração ao volante, neva na serra
os jornais não falam de outra coisa, a neve é a caspa da lua
o problema pode ser a atenção demasiada aos panos de treva
à argúcia dos gatos, ao fervilhar das enguias, às florestas matizadas
tundra e taiga, árctico e antárctico, zénite e nadir, josé e maria
há agora que não sonhar com pastelarias nem com mulheres
procura-se sem cessar a palavra justa
aquela que trará enfim a dormência
aquela que enfim trairá a atenção
a palavra às vezes entrevista num olhar, num gesto
sossega agora, bidon lunar
corpo jacente, território de enguias
o desejo dorme, são breves o túnel e
a próxima vida
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