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Segunda-feira,
8 de Março de 2021
Época de geral prisão-preventiva.
Estaleiro demorado a céu-fechado.
Pulsão de vida ainda viva.
Velas sopradas no salão-de-fados.
Ouve-se o trabalhar da máquina na curva que dobra a azinhaga. Amendoeiras florescem na mesma, vinte anos depois (+ quatro dias) daquela tragédia de Entre-os-Rios. Aguentar. O filão de coisas por aprender nem horizonte tem, de tão imensurável. Isso é beleza. Como esta janela, que nega sem resposta a solidez opaca da parede. Aí sim, sem cárcere.
Frederico, gentil namorado de Virgínia,
é quem faz as sandes na cantina.
Suporta humilhação & ignomínia,
a vida é par de dias que fulmina.
Pai viaja com filha entre-guerras. A melhor época, na recordação da vida quando velha, é a que vai de 1919 a 1932. Fazem a Itália profundamente, de pastores a coliseus. Fazem a Suíça mais alpestre. Nenhum queijo de França lhes é desconhecido. Planeiam o Japão – mas o pai adoece em 1933. Hitler toma o poder. A filha traz o pai para Portugal: Caramulo, a criação do visionário doutor Lacerda. Margarida, moça-de-cozinha, faz amizade com a bela turista. Esta aprende Português, já lê João de Deus, diverte-se com o Eça, dá longos largos amplos passeios pela serrania. O pai recupera um pouco, vão tomar o barco a Lisboa, sulcam o Atlântico, arrenda vivenda na sweet New England. O senhor morre aí, era o princípio de Novembro de 1940, a um mês da infâmia em Pearl Harbor. A rapariga é mulher, dá lições particulares de francês, italiano, alemão. Ninguém a requer para mestra de castelhano ou português. Partilha a casa com uma enfermeira oriunda Wichita, Kansas. Em 1950, deita a derradeira orquídea na campa do pai. Sobe ao Canadá francófono. Aí publica o primeiro original: Les Grand-Messes du Coeur. Discreto sucesso, suficiente todavia para alertar o bom gosto de Dilland & Viarco, Edt. Até à sua morte, menina de novo, a mulher publica em exclusivo para esta chancela de Montréal. Empilha os clássicos da sua pena única: L’Écrou; La Fournée; Mon Chien Aristote; La Mémoire sans Méridien; Si Papa s’Endort.
Tenho, Feliciana, tua lembrança
gravada a ferro na pedra.
Medra em mim desesperança.
A tristeza não se cansa,
baila, dança, requebra, alquebra.
É-se imperador de seu quintal interior. Não me parece que mais que isso haja a declarar em sede de conservatória predial & finanças. Conta-me certa página de um homem que na juventude se juntava a amigos, assavam peixe na praia, tomavam de conquista a noite que tomba sobre o mar, derredor o lume pasmavam saciados, incônscios então de que o mesmo lume ardia o Tempo mesmo. É amanhã internado um Carlos Alberto de minha particular simpatia. Ou foi-o hoje, não sei bem. Temo próximas notícias relativas à condição física desse cavalheiro. Estes lances mesclam-se-me na sintaxe.
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