© R.D.A.
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Sexta-feira,
10 de Setembro de 2021
A luz mesclava as qualidades do frio às da cinza
na manhã de unânime maravilha só local.
Minha era então uma mocidade que, hoje ’inda,
me assoma a lapsos em o ideário pessoal.
Em um trecho de via, sinais laranja-cónicos
demarcavam cautelas viajantes à passagem.
Em paquidérmica lentidão, pueris, cómicos,
os pesados rodavam bramando na paisagem.
Os oito versos acima expostos, compu-los em mais ocioso momento de uma manhã ulterior a si mesma. Anima-os, julgo, a velha (velha em mim) necessidade de experimentar a elasticidade idiomática. Em o plano pragmático mais chão & mais francamente comezinho, nada tenho a ou que dizer ao vizinho. O meu ócio, o meu momento, do meu idioma a elasticidade – de/para nada serve ao vulgo. Esta verdade estima em carestia o vulgo mesmo, não o subvaloriza – note-se bem isto, por favor (se não por caridade).
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Na plataforma da gare, em breve.
Juntar pequena maquia, ir limpo.
Fonte azulejada a azul-cerúleo.
Janela debruada a encarnado-fogo.
O viajante leva-se em leitura activa.
Vai ganhando papéis que o oficiam.
Nenhuma banalidade o ofende.
A verdade é privada, geral a ignorância.
Sobre colcha azul-tempestade, os livros.
Um, pleno da gesta doyle-holmesiana.
Outro, idem de fantassins napoleónicos.
Outro ainda, de Wenceslau de Moraes.
Experimenta ler Durrell no comboio.
De barco, embarca tu em Rilke.
No autocarro, os compassageiros:
deles, os rostos tornados medalhas.
Vento, vento constante, instante força.
Tão pouca gente a quem falar dele.
Longa, longa frase/verso ele soa.
E o viajante de papéis se perdendo.
Tive um Irmão nascido no exacto
vigésimo-quinto aniversário da morte de
Rilke. Também esse Irmão já não respira.
Esta conta é real – resto-zero inclusive.
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