País(agem)
bucarestiana
Sei muito bem que não é com crónicas (e muito menos com as
minhas) que se resgata o País do coma induzido em que se (des)encontra. Sei
pois. Só que também sei que os golos do CR7 e as novidades picantes do desquite
Djaló/Floribella não hão-de ser, como nunca foram, capazes de fomentar o
emprego a quem, por cândido civismo, ainda acha que é a trabalhar, e não a
roubar, que se ganha a vida.
De igual modo, não me é difícil concertar em axioma que
socorrer a banca não visa dignificar o maralhal, bem antes pelo contrário.
Encerrar tribunais, centros de saúde e escolas às cegas no Interior é directa
ordem para matar a interioridade mesma, reiterando a mania esquizofrénica de
que a Pátria se resume aos palermas de Lisboa, à estrada 125 do Algarve e a
essa pérola deitada aos porcos chamada Madeira. Ah pois é.
Todos os dias me levanto cedinho como a galinha. Ao
espelho do lavatório, raspando a barba chilra e rala que o vento genético me
semeou pela chanfradura sigmóide, verifico que aquele gajo canhoto é impotente
para despedir de uma assentada a escumalha corruptora e corrompida que lhe
proibiu o futuro das filhas, condenando-as, na melhor hipótese, a caixas
subassalariadas do Pingo Da-se. Por não ter tusto para after-shaves, chapinho
lixívia nos queixais e saio a rever o mundo não admirável e restrito da
portugalidade local. É paisagem tristonha, dormente e deprimente.
Romenos manhosos rondam carros estacionados. Algaravia-se
brasilês de avenida em estaminés de higiene nenhuma e lenocínio todo. A banca
de fruta da Glória da Anunciação exibe cerejas cariadas e melões espanhóis de
Almeirim. O barbeiro Teodoro, que é salazarista dos cornos e pedófilo das
pernas, tesoura maledicências contra os “comunistas do Governo”. A Genciana
Viúva (cujo marido a melhor coisa que fez foi morrer a tempo) amanda-se
copinhos de malvasia tinta da alva ao sol-pôr em ademanes de Senhora da Agonia
a quem o manto vai caindo à serradura do chão. O polícia Gervásio, que pensava
estar a nove meses da reforma, já não está a nove meses da reforma, pelo que dá
razão ao barbeiro Teodoro.
De modo que às nove e meia da manhã já estou
maníaco-depressivo de todo. Salva-me porém da tentação suicidária a diária
epifania da Noémia farmacêutica, cujos jogo de ancas e balcão peitoral emanam
optimismos existenciais os mais duradouros. Quando, pela noitinha, recolho a
penates, com e como a galinha, à capoeira para vegetar eldorados oníricos, digo
à mulher que o dia foi bom, que tudo-está-no-seu-lugar-graçazadeus, que um dia
destes ’inda me lembro de lhe trazer cerejas, que ’inda bem que não temos
carro, que o que por aí vai de romenos no Governo, ó Teodoro.
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