28/03/2020

VinteVinte - do 10 (um fragmento), passando por nada do 11, até aos integrais 12 & 13


© Ingarden.pt




10.

PASSAR HOJE

Coimbra, sábado, 1 de Fevereiro de 2020



I

Passei hoje pela extinta Rua da Nogueira, Coimbra,
uma vez mais & ainda soletrei a evidência passageira,
ali nos anos 40/XX dormiu uma noite o meu Pai,
essa casa sobe agora na transparência mais obscura,
é bem talvez ir ’inda passando por onde
quem memória já não pode por extinto,
dei pão farto às muitas pombas do Bot’Abaixo
– e fui talvez feliz por de lembrança remanescente.

Foi mais cedo (é mais cedo tudo o que vale?),
eu tinha de renovar o passe munícipe-transitário,
paguei a moeda à industriosa instituição,
fui talvez feliz dispondo a moeda, caçando o cartão,
quem enfim hoje caça amanhã se cassa,
é modo de dizer, não obriga tradição.
casquina-se enquanto há boca & saúde,
assim hoje foi, nem deus nem perdão.

(II)

(...)

(III)

(...)



11.

QUE DEUS TE GUARDE A PRECAUÇÃO


Coimbra, sábado, 1 de Fevereiro de 2020

(...)



12.

DUAS SERENAS

Coimbra, domingo, 2 de Fevereiro de 2020



I

Serena marcha a hora-laranjeira
do crepúsculo trepador nocturno.
Os de nós ’inda vivos assentamos
os ossos próprios na duração restante.

Caladamente damos curso ao ir-sendo:
quem sofre, fá-lo em retórico silêncio.
Mesas quadradas, madeira, metal & mármore:
bebedouros individuais, cada um a cada uma.

Hoje ao menos aqui não, somos de deix’andar.
Serenamos sem despesa verbal, ninguém sonha.
Ninguém sonha, ninguém projecta, ninguém espera.

Linhas aviónicas traçam o derradeiro azul.
O limoeiro da Vivenda Jeremias respira alto.
Ninguém s., ninguém p,. ninguém e.

II

A Ruy, de facto Belo

Por sabê-lo morto em 1978,
comove-me mais lê-lo em 1973, por exemplo.
Não se trata de comoção choramingueira, notai.
Trata-se de comoção ominosa, chuva-no-(m)olhado.

Guardei moedas, saí de casa pela tardinha.
O mundo dominical não oferece grande pugna.
Lentos animais meus homólogos rondam o nada.
Estamos em democracia, morrer é equânime.

Leio em 2020 o 1973 que sei 1978 & 1933.
Aplaco em serenidade a comoção honrosa.
Gostaria de vê-lo antiguecido, próspero, acalmado.

Não é possível. Agosto/78 foi terminante.
Fevereiro/20 é similar utopia ledora.
Os de nós ’inda vivos assentimos.



13.

NA LINHA-T.-Z.-Z.

Coimbra, domingo, 2 de Fevereiro de 2020



Coimbra é onde impero sobre os demais nenhures
em que vida hei causticado sem já remédio.
O desvario d’olhos foi além-nenhures:
mas ora sou de volta, daqui arcádio.

Isto é tudo meu, que me foi dado
por homem & mulher já hoje extintos.
Ao púbere Botânico orvalhado,
sucedo, sendo velho, íntimos ínfimos recintos.

Ao de agora turismo, mal não hei:
preferiria embora mais sossego
– luzes a gás-d’azeite – e haver rei,
e dobrar a Cabra susto morcego.

Conheço a rua, tão nua ao relento:
sou d’aqui como o fruto q’houve de flor.
Ao Largo das Ameias, vai o Sarmento;
à Sofia, o Antero Adamastor.

Tremelic’tropeço, envelhecendo
sem a grácil velhice avoenga,
dessa mesma a que eu, pertencendo,
sou linha-terminal-zinga-zenga.

Sem comentários:

Canzoada Assaltante