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Leiria, 28/IV/2013, domingo
IMPORTÂNCIA
I
Sou
um homem. Ou não. Ou ainda não, talvez não ainda. Sou um dos homens. Ah, assim
sim. Um dos. Nem a gilete me distingue de todos quantos outros. É verdade que
me exilo quando escrevo. O onanismo literário não é pecado – é só o processo de
consumir o Tempo das pastelarias, quando o domingo enverga o peplo merencório.
Entre homens do milénio estreado há pouco, parecendo todavia já que há tanto.
Se era afinal para isto o nascimento? Por que não, aliás?
Sou
o terceiro na fila da registadora para pagar o café e o pão. É de malares
limpos, a caixeira que recebe as moedas e, qual fada de salário mínimo, faz
soar o sininho da gaveta devoradora de cobres. Já a vi na praça, acabado o
turno. É quando solta o cabelo, trocadas as chinelas brancas (como as das
enfermeiras aposentadas) por botas de amazona sujeita a transportes
municipalizados. Se calhar, toca clarinete na filarmónica da vila onde a
segunda-feira da folga é uma eternidade reiterada pela cal do muro cemiterial e
pelos velhos sentados no rebordo do fontanário extinto esperando-a, à
eternidade. Colecciono cães imaginários que roem os ossos da infância.
Nada
é de grande importância.
II
Escrevem
os calhamaços por receita, metem-lhes umas cena de sexo para voyeurismo das divorciadas
que os compram nos hipers e nos cêtêtês, comentam merdas nas televisões – e
assim vamos todos andando abóboras cinderelas à espera da carruagem da
meia-noite, três ratos numa panela/outros
três num alguidar.
III
Ao
calafrio/arrepio de ontologias antológicas, no antípoda de baixo como de para
cima: bela maneira de passar a tarde, quanto menos não seja e mais não for.
Como este cavalheiro, muito cívico em sua solidão tipo
fato-de-treino-dos-domingos, muito bucal de um mau hálito a papel-selado e
maneiras vinte-e-cinco linhas vincadas na longitudinal. Chega a ser comovente a
evidência do poço tão vão que é no concernente às necessidades afinal mais
básicas (o m. q. excruciantes) da vida, i. e.: um pouco de Vivaldi (embora, é
claro, Lester Young), as recordações desenfreadas a meio da fala que alguém nos
tosse ao rosto, o sabor a outra coisa da água bebida numa cidade onde se não
nasceu mas em que é possível morrer – e a possibilidade de morrer agravada pelo
desejo de renascer lesto e jovem, ou Lester Young.
IV
O
sem-abrigo. Deram-lhe um pão que era para as pombas, não tem mal que um pouco
ratados os três – o pão, quem o recebeu e quem o deu.
V
Nem
sei que haverias tu de querer mais, se alguma coisa e que coisa, afinal há chá
e bolinhos, de canela uns, de noz outros, de manteiga açucarada todos. A
verdade é a verdade não ser precisa: nem de necessidade (ou obrigação) nem de
acuidade (ou precisão).
VI
Além,
entre este caderno e o Rio (flúx, ambos), um rapaz careca com uma mulher
vermelha. Ele fotografa postais trivibanais da Cidade, ela vai andando. À
noite, ela não anda – alterna. Já deu para ter com lhe comprar a Nikon.
VII
Vai
e volta com o vento o olhar as coisas.
Só
não é o mesmo, quando ao sítio volta,
o
sítio de que com o vento se deixou ir.
Há
uma mensagem nisto, mas desconheço
que
cifra a emaranha e me a torna
irresgatável.
Tenho de volver-me coisa
e ser olhado de eólica mente.
e ser olhado de eólica mente.
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