calças verdes,
o rosto tão branco:
um lírio
ambulatório.
Formosa senhorinha
da meia torrada,
da cha-chá-vena.
Mãozitas de fina faiança,
olhar de quase-criança,
pèzitos que nem sombra
pisam (ou precisam).
Alt(ei-l-)a.
*
Aconteceu-me há pouco: escutei a minhaprópria voz enquanto dizia alguma coisa
a alguém, não sei já quem.
Foi no exacto momento mesmo que dizia.
Pareceu-me algo combalida, a voz dessoutro.
Era de um homem que me habita amanhã?
Ou a de algum ancestro por minha vi(d)a?
Não era agressiva nem doce.
Era só uma voz: uma oratura, um metal.
Devo andar muito a falar sozinho.
Muito, digo, tipo coisa de há quarenta anos.
*
Olha, um homem de olhos verdes:por azeitonas ou esmeraldas olha.
Que ele é pobre, sei-o eu bem.
Trabalha numas bombas de gasolina.
Ele olha arrelvadamente à chuva.
Tem um telemóvel dos baratos, umas
sapatilhas das descalças, umas
bragas no fio (da navalha), umas
vinte unhas, dois lábios, oito metros
e tal de tripas delgadas e grossas,
uma caderneta de cromáticas recordações,
um par de bambinos, uma mulher-nas-
-limpezas, uma avó hirta como uma
tábua de andaime, um passado
histórico, uma autognose absolutamente
involuntária, uma projecção astral,
uma irrisão áugure, um ricto labial
traidor de semiologias nervosas, uma
impossibilidade de conferir a Manuel
Alegre o estatuto de trovador sem
contar com as cheias de águ(ed)a e o
exílio em Argel, uns dois olhos
verdes.
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