24/08/2007

Ora Aponta Aí

Este poema é,
por natureza,
da natureza
dos senhores
Zé Antunes Ribeiro
e
Manel Barata



Tarde de mais para que o que digo se não escreva sozinho.
Nasci de manhã, percebo e aceito a noite: digo de mais
a tarde, OK.
Tenho mulheres que já não quero ouvir dizendo.
Elas são postais, sempre na orla do mar brisando
frios invernos salgados, ainda se eu tivesse telefonado a tempo,
mas nesse tempo o posto dos correios era todo na mercearia,
eu não podia saber que elas mudariam de estação,
não eu, que nada digo.

Nada digo. Tenho algumas coisas para dizer, mas
chego sempre tão tarde aos correios e à mercearia,
há vezes em que às vezes chego tão tarde, que até
o totoloto é a preto-e-branco, cruzam-se no salãozito
de serradura as samarras e as mulheres
que vieram ao vinho, essas que cortam lírios
para celebrar a Deus quando Ele desce a cortar
samarras,
não é?,
é.

Ainda tenho três ou quatro por aí,
três ou quatro que olham para isto e não escrevem,
dizem

– Olha o gajo

pois dizem
e não escrevem.

Fazem elas e eles bem.


Caramulo, la nuit de 24 de Agosto de 2007

2 comentários:

José Antunes Ribeiro disse...

Caro Daniel,

Obrigado, o prazer de te ler compensa muito do meu desencanto com esta república (i)letrada!...
Um grande abraço!

Manuel da Mata disse...

Gosto da epígrafe(?) e do poema. Representa, antes de mais, um gesto de sã camaradagem.Que assim continue a ser por muito tempo.
As obras dos arquitectos são vistas e admiradas por toda a gente. Mesmo que a admiração se expresse num simples oh!.Os poetas não têm, nem nunca terão, muitos admiradores. Lêem-se e treslêem-se una aos outros e já não é nada mau. O Zé Ribeiro, melhor do que ninguém, sabe disso.
Podem ser poucos, mas tens leitores fiéis. E este facto já é uma graça.
Abraço firme,
Manuel

Canzoada Assaltante