08/02/2022

REGISTOS CIVIS - 50

© DA.


Mescla – 50



    Somos pessoas distintas: por distinção pessoal, umas; porque enfim diversas entre si, todas. Cada um/a é de quotas solitárias. Constituição & dissolução são irmãs. Fernando Pessoa, por exemplo (maior) era uma sociedade-colectiva-em-nomes-individuais.

    O egoísmo – antivirtude ou condição de sobrevivência? Nenhuma destas ou estas ambas? Parece fácil distinguir – a mim, não, não parece. Quando ante meus olhos mesmos vejo desfilar quanto fiz & desfiz, hum, não sei responder quê, nem porquê, nem para quê.

    Interessa-me muito a mescla mais ou menos espontânea de elementos originalmente esparsos – e que a experiência vital/mental torna interagentes. Na Rua dos Sapateiros, o senhor Fernando Amável; o senhor Truman Capote em Wolcomb, Kansas.

    Água, luz. Gás, condomínio. Capital-social. Património, matrimónio. Holmes, Watson. Quijote, Sancho. Pai, Mãe. X, Z. Cabimento, despropósito. Actividade, contemplação. Café, leite. Castang, Van der Valk. Georges, Jules. Simenon, Maigret. Trevas, seca.

    Em espécie de ilha (istmo raramente), Jorge Margarido Vitorino Osório, 60 anos contados em Janeiro último. Carpinteiro de cordofones: exímio artesão. Oficina que de seu pai (carpinteiro de móveis pequenos) herdou. Nem mulher, nem filhos, nem irmãos. Um vago primo, algures.

    Catarina & Guilherme – um matrimónio infeliz. Mais um. Liga-os um par de filhos, papéis assinados, sociedade comercial (microempresa). Desliga-os o resto, todo o resto: cores, pulsões, favoritismos, comidas, praias, tarecos, bibelôs – menos livros, nenhum deles lê.

    Efeitos distintos, vozes de passaritos em euforia nupcial, quotas de 1 (um) euro, garantias para além da palavra-dada, está na posse de André Miguel Velindro Borges, um álbum de fotografias de 1984, não foi (ou foi?) assim há tanto tempo, mas – quantos mortos ali sorrindo, senhores.

    Tomé Henriques Ruibarbo Níveo pergunta a Alice Maria Batoréu de Orla se ela-Alice, o mais tardar às quatro da tarde, lhe favoreceria um soneto, livre ou medido, de que ele-Tomé pudesse simular-se autor ante sua-dele-Tomé amada. Alice aquiesce:

    Passando-se comigo coisa estranha,
    indaguei dela aos ventos d’alboroto.
    Semelha em mim o mui querer por minha
    a pessoa de que és modo infinito.

    Avenidas devasso, a sós sempre,
    almejando um tal rumo feito pessoa.
    Peito escancarado, espero que entre
    por minha Betesga toda uma Lisboa.

    Não passa o tempo por sempre ser hoje
    o dia de te pensar repensando.
    Mas passa o Tempo, o tempo que me foge

    sem que momento teu venha chegando.
    Este soneto visa provimento
    de rumo, tempo & de um teu momento.


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Canzoada Assaltante