12/10/2021

PARNADA IDEMUNO - 795

© DA.


795

Segunda-feira,
11 de Outubro de 2021

    Saí à outonalidade possível & disponível do dia. Coimbra lá estava, como cá está. Apreciei a nossa, obstinada embora quebradiça, condição: a humana. Resolvi o papel que tinha a resolver. Desta feita, não me dei ao luxo triste de perder tempo – resolvi o papel, desci a Sá da Bandeira, encontrei abrigo-receptáculo para este relato.
    Antes de sair de casa, telefonou-me o bom João S.P. Há q’anos nos não falávamos, c’um caraças! Gostei de atender-lhe a ligação, as velhas novidades de nossas não novas idades. Só depois, sem almoçar nem apetite para tal, me dei saída.
    Banha-me sempre de lustral idiotia amável a re-visão de cada rua. Esta Cidade, a que pertenço, pertence-me. Esquinas & pessoas idas mesclam-se-me em uma harmonia só para mim pautável: a clave é pessoal e, a não ser talvez por a minha remendada literatura esta, indecifrável. Escrevo ora um pouco antes de tornar a casa.
    Entre o Mercado & os contrafortes da antiga Biblioteca Municipal, ocorreu-me em virtualidade um livro (a chamar-se) – A Cidade Engraçada. Epígrafe dele: Antes cair em graça que ser engraçado. (Da sabença popular). Pode ser que ainda o escreva. Tipo manual (ilustrado) de textos revisitadores. Muitas linhas hei já escritas que a tais viso & formato apontam. Não é ideia a desconsiderar.
    De resto, cumpro a hora decorrente. Não reverei além o Zé Peres. Não passará por ali o Alvarito Santos. Não voltará a casa o Chico Morais. Nem outros nomes continuarão usando pessoas para serem. Laura. Cláudia. Maria da Conceição. José António. Rui Foz. Vítor Rodrigues. Tantos cartões que a mecanografia não precisa já de conferir. Esta sabença amargura-me recorrentemente. Vale-me a epifania seguinte: na Rua da Moeda, livre & magro como a andorinha, passa um rapaz quarentão cujo capacete de cabelo assombra até o mais hirsuto. Nem um fio branco lhe empoeira de giz a grenha. Poderia, mas não usa, fortíssimo bigode & indevassável barba. Levava pasta preta de aviador notarial. Talvez represente alguma firma (como antigamente se dizia dos caixeiros-arthur-miller-viajantes: que representavam). Não sei. Sei pouco de muitas coisas.
    Esta é a minha lentidão improvável.
    Equivale à V.ª por grosso, não a retalho.
    Conhaque é conhaque, trabalho é trabalho.
    Sou um por estas ruas de idiota amável.
    Sirvo-me de elucubrações retrospectivas.
    Em vivo sendo, anoto usos & hábitos.
    Machucam-me novas que trazem óbitos.
    Prefiro das mortes tirar linhas vivas.
    Queima-me a boca figurada a pimenta morta.
    Sou o senhor que nem sempre erra ou acerta.
    A tua vida, querida? Não serei eu a consumir-ta.
    Muitos ou poucos anos, sabe sempre a curta.
    Casal de portugueses ’queninos acolá passa.
    Antes que engraçado o sair-se em graça.
    O soneto aqui entalado/encalacrado reflecte, penso eu, certa propensão minha a dar por cifra o que em linguagem-corrente pouco/nada/zero importa. Supra, escrevi: Esta sabença amargura-me recorrentemente. Verdade. Não minto. Sabeis? Sou, tal V., alguém que refere & referencia. E se refere & se referencia. (Cf. supra: Esquinas & pessoas idas mesclam-se-me (…).) Um dia, bifes encebolados. Outro, cerveja morna. No entrementes, viajante sentado. Barco que devagar adorna. Por assim dizer, digo. Digo ainda: nada vai impedir a Maré-Amarela. É o antepenúltimo estertor do humano-planetário. O lixo há-de varrer tudo. Não se trata do meu apocalipse individual (que é vero) – mas sim da esterqueira-a-mais, poluta-presença-a-mais. E com os Chineses à frente. Os ex-Soviéticos caem de bêbados; USAmericanos, de burros. Sobram a China & Portugal, que é todo Algarve para Ingleses Pretos. Mas esperai, por favor:
    Não sou imune à propaganda estadonovista.
    Ainda comigo as Capelas Imperfeitas, sim, hão valor.
    O Taí era o careca do Boavista.
    E a ninguém me propende gás-de-rir-amor.
    Fundação-Nacional-para-a-Alegria-no-Trabalho.
    (E inatel agora democraticamente.)
    (Equivale, por grosso, à V.ª alegria, não a retalho.)
    Estes versos são de gente para nenhuma-gente.
    (Verdade. Esta última linha, a da nenhuma-gente, é verdadeira a sério pa’ valer.)
    Outras linhas/lenhas arder podem ainda:
    Sobram a China & Portugal,
    em cima descrevi – e é certo.
    O Império a seguir está mal:
    & o antecedente não era alberto.
    Morro antes da tomada de Taiwan?
    Pela China. E da da Europa.
    Pela China. E da da América.
    Que já era. Pela chacina-china.
    Aquilo nem comunismo é. Aquilo é gorilismo. Aquilo é formiguismo. Aquilo é a vespasiática em seu supino fulgor. Aquilo é o que o manual sobre Coimbra Engraçada nada diz. Eu vou aos chineses comprar palmilhas ao desbarato. Falta minha: sei mais de escritores japoneses do que de idem chineses. Talvez porque: haja mais, de valor, quem seja nipo do que chino. Não sei. O Mao mandou matar pardais. O Hirohito não fez seppuku. Não sei. Sei que é felizmente longe. (Mas só por enquanto, receio bem.)


 

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Canzoada Assaltante