07/10/2021

PARNADA IDEMUNO - 786 A 793

© DA.

786

Terça-feira,
5 de Outubro de 2021

Os ex-vivos que criaram livros persistem em ter voz.
E têm-na, rediviva, por mercê da atenção ledora.
Como no princípio, sigo sofrendo tal fascínio.
A só aparente mansidão de tal vozearia paginada.
A inteligência das mais profundas impressões.
O convívio finalmente verosímil de deuses com mendigos.
Em a praça, o escultor continuado pela estátua.
E mais: o estado-da-nação-pessoal quando lemos/vemos.
Quem tu eras quando te deste a Ray Bradbury.
E depois, em outro tempo, de outra idade a releitura.
O sublinhado juvenil apreciado mordazmente, ora que velho.
Em ajuda, da janela manando a luz mais propícia.
Do café matinal ao chá vesperal, em articulada pose.
Solidão com proveito, auto-suficiência harmonizada.
Prado Coelho (o Jacinto, não o gordo) sobre o(s) Pessoa(s).
Então, a lembrança do lido torna feriado o pretérito.
Todo o pretérito, ele todo dia-santo, de féria paga.
Sim, Ian Watson & Henry James na ala franca.
Aqui há/é lugar para edificação de alguma coisa.
Não uso pressa nem posso demora maior.
Ainda ontem li, sem ser livros, preto-no-branco.
Amanhã não sei que linhas são as possíveis.
Sei que tenho hora-marcada (11h00m).
Depois ou antes dessa página, já disse – não sei.
Não se lê tanto para saber como para ser.
Acaba-se s(ab)endo alguma coisa.
Quando se sabe alguma coisa, acaba-se.
É um jogo: partida em sentido duplo.
O rapaz Truman Capote, a senhora Mercè Rodoreda.
Segura-se o Tempo com as costas? Não se segura.
Posso tanto pensar na minha Avó como em Virginia W.
Para o efeito, dá precisamente o mesmo – com variações.
Ainda ontem, de carro, pelas ruas-prédios.
Contemplação de livro aberto, amplo, violável, sabeis?
Sem dor ou pudor, sem mal nem remédio.
Um por-aí-andar-em-concerto-ou-não, tanto dá.
A paz desempregada dos subúrbios, onde o Sol bate a sós.
Onde o Sol bate a sós como um Solteiro, juvenil ou não.

787

Quarta-feira,
6 de Outubro de 2021

Doçura que não
Enganosa é
Tira o pé do chão
E o chão ao pé

São certas palavras
Glabras elas são
Nesse chão que lavras
Tira o pé do chão

Formosa gaiata
Exacta & rosa
É maravilhosa
Maravilha exacta

Se é minha Filha?
Como houvera não?
Um homem é ilha
Todo mar sem chão.

788

Voltei a levantar-me muito cedo.
É bom, parece-se com nascer de novo.
Nascer de novo mas, olhai, nascer
sem ser para o futuro – ou coiso.
À primeira chávena de café,
desestremunhada a frio a cara,
assumi não perdido o ser.
A minha senhora Mãe, ah, ela
gostava de assim matinas boas.
Mais do que mera rima, sim,
lida & vida sinonímia lh’eram.
Era vê-la retomando comando
das cousas-não-ciprestes,
das cousas-não-obituárias,
das vivas cousas da vida,
da lídima lida linda
ainda
ainda.
Voltei a (etc.)

789

Em resposta ao solicitado por V.ª Benemerência:

Não troco de cuecas por quem seja
Faltista a horizontes modernistas.
Comigo, ó evangélicos-baptistas,
Baptismo só se for de grã cerveja.

Não dou de caras o que for mais triste,
Q’existe para além, mais comezinha,
Muita vida assim, q’já mal existe
Mas persiste em chamar-se tua & minha.

Não troco de meias com testemunhas.
(De Jeová bem menos, já se sabe.)
Não hei esterco nos dedos nem nas unhas,
Em mim é descabido até quem cabe.

Filha, ó tu não me namores com esse,
Qu’ele é zapatista & libertário.
Bossa nova é de bebé-dromedário,
E eu não me fio nem confio nesse.

790

A vaidade é uma igreja como qualquer outra:
reza sozinha a um deus sozinho, carestia de velas.
Humilde, só como bife da alcatra:
e ’stou-me nas tintas d’elas-por-elas.

Não cuidamos de grande gente ao lado,
q’anónima persiste em seu fado.
Perdemos pobre-tempo-pobre-gente
insciente-do-chover-no-molhado.

Direi ou darei tão pobres falas
que tu não ouves nem dizes nem calas?
A Arcília já me foi – e já me não volta:
tempo é de meu cavalo andar à solta.

O meu extracto bancário, pobrezinho,
foi gasto não em gajas mas em vinho.
Outros investiriam no futuro,
que usa ser incerto & de pão-duro.

Sou mais rodrigues-lobo quando calha.
mais francisco-man’el-de-melo também:
calha ter versos feitos memória-Mãe,
terra de quem na cultiva & trabalha.

791

Morrer na prisão
Por delito de opinião
Não me parece
Modo de vida
Ao menos desejável
Isto para dizê-lo
De um modo, hum,
Coiso tipo amável.

792

As solenidades tribunalícias
São de esfera que eu-enfim-realmente
Não considero ser caso de maus-polícias
Nem de sevícias da coiso-aguardente..

793

(Ensaio de Oratório:)

Alerta a quem de palha infinda
A burro não falta (a)celerado
Alerta a quem a Virgem ainda
Não, Deus, deu por miraculado.



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Canzoada Assaltante