20. Para Consumo da Casa
a) Sexta-feira, 29 de Novembro de 2019
Da sala, espectáculo vivo do
Novembro-moribundo: campânula nublando o mundo, fechando-o em ensimesmamento
húmido, varrendo as gentes para a invisibilidade, convocando a pujança da vegetação
que resistiu ao cimento, ao vidro, ao plástico, à borracha. Como se o Loreto, o
Casal Ferrão, a Relvinha, o Brinca e o de São Miguel renasçam – mas sem homens
– Reichnam, Echternach, Lieja, Bamberg e Hildesheim, com Aix-en-Chapelle para
menos riba.
Da casa, em casa, consumo &
consumação. Nem rendição, nem heroísmo. General aqui, soldado lá fora.
b) Sábado, 30 de Novembro de 2019
(Sempre que posso, não escrevo.
Nem vivo.)
Gosto muito de quando o bando, de
uma só vez & a uma só voz, debanda, oblíquo, do chão para a torre. Alguns
retardados odeiam-nas. Eu sou columbófilo, cuspo no focinho dos columbófobos.
Trago-lhes comida, evito dirigir-lhes palavra que não escrita. Sobreviventes da
mesquinhez, cagam acidamente na arquitectura que os monárquicos, de mão-beijada
como é deles tão próprio, deram aos republicanos.
É prata mas azul mas à noite chamo,
sobretudo quando de manhã acontece.
Homens com sacos, homens ensacados.
Orlam o sábado como rangentes
relíquias.
A administração alguma satisfaço
estas linhas,
as contas sempre estiveram feitas,
foi sempre zero o resto.
Já o rosto, o rosto é outra coisa.
Não muitas horas demora já
Novembro,
em pouco será noite, não mais dia
verá Novembro dar-se de si,
Dezembro traz consigo as merdas de
costume.
O fundamento parece incomunicável,
fizeram negócio seu os padres à
comunhão,
no rectângulo restrito d’onde olho
conto oito-árvores-oito, prédios
das aves.
À parte o que me sonha, durmo bem,
melam-se-me os olhos, a boca
sossega,
o Gato reina no escuro fosforescente,
venha ou não a manhã verei ou não.
*
Sítios a que nunca fui ou irei
– trouxe escritos.
Em que estive, mas sem lápis
– esse o meu papel.
*
Pai meu que não estás no céu,
a realidade nunca foi o meu quintal
favorito,
seu sim, onde os animais nos eram
de sangue,
irmãos que até hoje religião alguma
agremiou.
Mãe minha que à terra restituímos,
esta trangalhadança horária suja as
cortinas,
ao vão – que em vão, não – janelas
abro,
vejo a senhora nas pequenas coisas,
lácteas todas.
(…)
GEOPOLÍTICA tipo PEDIMOS DESCULPA
POR
ESTA INTERRUPÇÃO – O PROGRAMA
SEGUE
DENTRO DE MOMENTOS
Olha, vamos é jantar aos chineses
antes que eles nos devorem.
*
“Fala
pouco de mais”
– diz no autocarro, do neto, a
velha.
Mais sábio, o neto.
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