I. QUANDO AS FILHAS FAZEM 40 ANOS, OS PAIS ESCREVEM POEMAS OU PIOR
Pombal, manhã de 22 de Abril de 2010
Fala-me um pouco enquanto a manhã não acaba
Os dias correm enxutos ao colo das pedras roladas
Os talhos funcionam à base de matadouros
E são mansas a minha filosofia, a minha vanidade.
Espero por ti onde o coreto deita sombra
Não é fácil ser feliz de tarde, tenho tentado
Diz-me da tua vida, dos teus negócios
Conta-me das rainhas da noite, das nespereiras.
Escolhes o mais macio dos casacos, sais sozinha
As luzes das montras são as jóias da tua noite
Os Correios estão fechados, pulsam os semáforos
Anda um pai a criar uma filha para isto.
II. QUANDO ESCREVO, NEM ANTES NEM P’LO CONTRÁRIO
Ibidem
Faço todos os dias por haver amanhã
Mas ontem é a minha condição, não a tua.
A rua vive de expedientes, o mais são gentes
e eu derivo por bancas de fruta e demais sílabas.
À luz do que sei, as sombras são
as veras companhias do homem só.
Pó recolho do casaco, dos sapatos pobres,
mas olha-me tu que um dia destes.
III. FORGIVE ME, S’IL VOUS PLAÎT
Ibidem
Ó absolvição feita manhã,
ó reparações de televisões, ó poesia:
dai-me a relojoeira romã,
dai-me o perdão da malvasia.
IV. RIO-ME MUITO POR COMOÇÃO
Ibidem
Rio-me muito por comoção ante a beleza
governada de casas e aves, finda a manhã.
A luz é tanta, minha senhora, que inunda
de mundo as coisas todas, as coisas todas.
A simples passadeira transversal,
que é signo branco & preto da passagem,
tem da zebra-barra a mesma imagem,
do nascer que morrer é natural.
2 comentários:
e a poesia é aqui como uma segunda pele.
bons poemas!
um grande abraço
jorge vicente
Vindo de quem vem, muito obrigado, Jorge.
Enviar um comentário