28/11/2007

LOURIÇAL AO VENTO DO TEMPO - Peça-Guião para a Festa de Natal do Instituto D. João V


Pediram-me um texto para a festa de Natal deste ano do Instituto D. João V, no Louriçal. É uma comunidade escolar em que trabalhei, no século passado. Tenho lá muita gente amiga e uma filha. Disse que sim. Escrevi-a no domingo passado, 25 de Novembro de 2007, e aparei-lhe as unhas na manhã de 26. Vai ser representada naquela Escola no dia 14 de Dezembro, salvo erro. Foi um prazer. (Aquilo ali em cima é a Passarola de Bartolomeu de Gusmão).
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LOURIÇAL AO VENTO DO TEMPO
Peça-Guião para a Festa de Natal do Instituto D. João V
(Louriçal)


Personagens fixas:

Narrador (Voz Off)
+
D. João V
Madre Maria do Lado
Professor de Português
Bartolomeu de Gusmão
Professor de Português
Poeta Tomás António Gonzaga
Poeta João Xavier de Matos
+
Colectivo de Alunos (incluindo grupo de Freiras)


VOZ OFF

O século XVIII foi talvez o período da História que mais contribuiu para a notoriedade do Louriçal. É verdade que a história desta terra não começou no século XVIII. As origens conhecidas do Louriçal remontam aos tempos dos nossos primeiros reis, D. Afonso Henriques e D. Sancho I. O Rei Fundador concedeu ao Convento de Coimbra o couto do Louriçal.
Muitos anos depois – mais propriamente em 1514, no dia 22 de Agosto – El-Rei D. Manuel I outorga em foral o título de Vila a esta terra de bons ares e melhores costumes. O senhor da terra chamava-se Simão de Meneses.

(Adianta-se um aluno e diz:)

Duas freguesias compunham a velha Vila: S. Tiago (dentro da Vila) e S. Mamede (à Mata Mourisca).

VOZ OFF

No século XVII, era viva uma mulher cujas vida e obra ficaram indissociavelmente ligadas ao Louriçal: era muito devota e tornou-se freira. Chamou-se, e chama-se ainda, Soror Maria do Lado. Mas dela já mais história se contará. E hoje? O que é o Louriçal hoje?

(Alunos declamam em ordem a designar pelo Encenador:)

Ó Louriçal,
terra de encanto certo,
Com aroma de pinhal
E do mar que fica perto

Ó Louriçal,
de profunda tradição,
tu não conheces o mal
e dás bom nome à região.


VOZ OFF

Nos séculos XVII e XVIII, a ideia de Deus andou por aqui. E em 1836 veio a ordem administrativa nova: o Louriçal deixa de pertencer à comarca de Coimbra e passa a integrar a comarca de Pombal. Foi fila e sede de concelho até 1855. Quarenta anos depois, em 1876, vem o benefício da estrada que liga o Louriçal a Pombal, de um lado, e à Figueira da Foz, do outro. No dia 20 de Maio de 1993, dá-se a reelevação o estatuto de Vila. Hoje, os 5 mil habitantes do Louriçal orgulham-se dos seus 48 km2, pelos quais se espraiam os lugares.

(Alunos, um por cada nome de terra, dizem:)

Antões
Barroca do Outeiro
Borda do Rio
Cabeços do Outeiro
Casais de Além
Casais do Porto
Casais Loureiros
Casal da Rola
Casal do Queijo
Casal Mouro
Casas Brancas
Castelhanas
Cavadas
Cavaditas
Cipreste
Enjoa
Espinheiros
Foitos
Furadouro
Louriçal
Matas do Louriçal
Matas da Vila
Moita do Boi
Outeiro do Louriçal
Ribeira de Santo Amaro
Santo António
S. João das Tábuas
Serafim
Torneira
Valarinho
Vale da Cabra.

VOZ OFF

Atenção, muita atenção, pede-se a comparência de Madre Maria do Lado!

MADRE MARIA DO LADO

Chamei-me em vida terrena e secular Maria de Brito. Quis-me Deus a Seu lado: Maria continuei – e do Lado.

(Adianta-se um aluno e diz:)

E eu chamo-me Simão Lopes Solis. Acusaram-me de arrombar o Sacrário da Igreja de Santa Engrácia para roubar as hóstias consagradas. Não me lembro. Dizem que foi pela calada da noite de 16 de Janeiro de 1630. Dez meses depois, fui condenado à morte. E mataram-me a 3 de Fevereiro de 1631.

MADRE MARIA DO LADO, apontando para Simão:

Eu tinha 25 anos. O Senhor soprou-me Sua Divina inspiração, tal que eu fosse em confissão a Frei Bernardino das Chagas, do Convento Franciscano da Figueira da Foz. Assim foi que eu, Maria de Brito, mais cinco companheiras iniciámos um Lausperene de adoração e desagravo do Santíssimo Sacramento. Foi no dia 12 de Abril de 1630.

VOZ OFF

Poucos meses eram passados quando estas seis mulheres instituem um Recolhimento. Tinham recebido o hábito de Terceiras Professas da Terceira Ordem da Penitência de S. Francisco logo no dia 13 de Abril de 1631, um ano e um dia depois do início do Louvor Perpétuo do Santíssimo Sacramento em redenção do crime de Lisboa.

MADRE MARIA DO LADO

Foi em casas de meu Pai, junto à Igreja da Misericórdia deste Louriçal em que nasci, que começou a arder de pura luz o nosso devoto Recolhimento. Até meu Pai, António do Rego, tomou o hábito de Terceiro Franciscano.

(Adianta-se aluna/freira e diz:)

Nossa Madre Maria do Lado morre em odores de santidade no dia 28 de Abril de 1632, já com lugar no Céu garantido depois de tão breve e dedicada vida. Cedo a quis Deus junto Dele, como sempre Ele quer aos que mais ama.

(Grupo de alunos declama, em ordem de falas a designar pelo Encenador – quanto mais alunos, melhor:)

Santa, santa, santa
Foste e serás, ó Maria
O horror da calada noite
Tornaste tu amor e dia.

Teu corpo está no Convento
Tua alma no Céu está
A vida é só terra e vento
Mas é por Deus que ela há.

Aos mais pobres tu amaste
Teu mesmo pão a ti roubaste
Tal que a fome os não comesse
E aos pobres quiseste e deste
O que de Deus recebeste
Aos mais pobres mais amaste.

Santa, santa, santa
Foste e serás, ó Maria
O horror da calada noite
Tornaste tu amor e dia.


VOZ OFF

O rei D. Pedro II, pai do futuro D. João V, compadece-se da fama de Madre Maria do Lado e manda construir um convento no Louriçal. A obra haveria de ser concluída pelo filho, D. João V, em 1708. Às esmolas das pessoas une-se o subsídio real – e a obra nasce do mesmo lado que deu nome religioso a Maria: o Lado ferido por lança do corpo de Jesus Cristo na Cruz.

D. JOÃO V

Em Mafra como no Louriçal, dei obra ao meu ouro brasileiro. Sei muito bem quantos pecados me atribuem e quão mal de mim dizem. Mas eu sou D. João V – o Magnânimo, o Magnífico! Ainda o meu nome há baptizar uma escola neste lugar do Louriçal!

(Alunos, em ordem a designar pelo Encenador, vão “atirando” frases ao Rei:)

Nasceste em Outubro!
Morrerás em Julho!
1689!
1750!
Magnânimo!
Magnífico!
És segundo filho de segunda mulher!
Mandaste dourar capelas!
E andavas dourado como elas!
120 milhões de cruzados custou o Convento de Mafra!
Lisboa dividiste em Oriental e Ocidental!
De tostões nunca cuidaste!
Só de milhões!
DIZEM TODOS OS ALUNOS A UMA SÓ VOZ:
Muitos milhões, muitos milhões!
VOLTA UM ALUNO POR FRASE:
De alfaias, pratas e 6 mil cruzados dotaste o Convento do Louriçal!
DIZEM TODOS OS ALUNOS A UMA SÓ VOZ:
Assim está bem, nunca foi mal,
Assim está bem, nunca foi mal!

D. JOÃO V (em tom de pisca-olhos para o público:)

Estão a ver como sou bom?
Estão a ver quem foi o Maior, o Mais-mais-mais-mais-mais-mais-mais?
Eu, D. João, “o quinto do nome na tabela real”, como há-de dizer de mim um tal José Saramago…

VOZ OFF

Dezanove freiras vivem hoje, século XXI, em recolhimento no Convento do Louriçal, cumprindo o impulso inicial de Madre Maria do Lado. Longe vão os tempos da instauração da República, em 1910…

(Alunas/freiras de joelhos e em pânico:)

Jesus Senhor, a República, a República, o Monstro Vermelho e Verde!
Jesus Senhor, livrai-nos de todo o mal!

D. JOÃO V

Eu cá nunca liguei nada a repúblicas…

VOZ OFF

Todos os dias rezam as freiras louriçalenses em desagravo do Santíssimo Sacramento violado em Lisboa naquela hora má de Janeiro de 1630. rezam e trabalham: bordam, fazem doces, dão corpo à hóstia eucarística e vivem na sombra o ofício da Luz.

(Entra o PROFESSOR DE PORTUGUÊS:)

Isto está tudo muito bem. Mas não pode ser que só a História mostre trabalho neste Instituto que tem o nome de D. João V. Então – e poetas? Será que não houve poetas de grande mérito no século XVIII, o século do convento?

(Um aluno diz para o PROFESSOR DE PORTUGUÊS:)

Ó setôr, olhe que isto é uma festa, não é uma aula, ó setôr…

PROFESSOR DE PORTUGUÊS

Uma aula também pode ser uma festa, ó João!

VOZ OFF (dirigindo-se ao PROFESSOR DE PORTUGUÊS:)

Ó colega, desculpe lá o mau jeito, mas que poetas quer o senhor lembrar? Não me diga que um tal Bocage… Olhe que a hora vai sagrada…

D. JOÃO V (imponente)

Eu sustentei muito músico, muito pintor e muito arquitecto!
Venham daí esses poetas do meu tempo, venham!

(Entra o POETA TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA:)

Chamo-me Tomás António Gonzaga e não sou do Louriçal – peço perdão se venho incomodar…

D. JOÃO V

Incomodas nada, homem, chega-te à frente, que o rego é estreito!...

POETA TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA

Nasci no Porto em 1744.

D. JOÃO V (em àparte)

1744? Caraças, que só faltavam seis anos para eu bater a bota…)

POETA TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA

Meu pai e avós eram brasileiros. Para o Brasil eu fui aos sete anos de idade. E do Brasil volvei em 1761 para estudar Leis em Coimbra.

PROFESSOR DE PORTUGUÊS

Então diz, Tomás, um poema, se fores capaz!

(TODOS OS ALUNOS, A UMA SÓ VOZ, REPETEM O DITO DO PROF.)

Então diz, Tomás, um poema, se fores capaz!

POETA TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro(…)

(INTERROMPE-O O REI, COM MADRE MARIA DO LADO TENTANTO TAPAR-LHE A BOCA:)

Mas quem era essa Marília e que te importava ela, se vaqueiro não eras? Estou a ver que nem todos os meus bons exemplos pegaram moda…

PROFESSOR DE PORTUGUÊS (orgulhoso, explicador…)

A Marília do Poeta era uma rapariga da boa sociedade brasileira de Vila Rica, em Minas Gerais. Chamava-se Maria Doroteia Joaquina de Seixas. À boa maneira arcádica, o Poeta chamava-lhe Marília…

MADRE MARIA DO LADO

A única Poesia está no Amor de Deus, não no da carne de homens e mulheres…

D. JOÃO V

Ó Madre, já agora deixe lá ouvir o moço…

PROFESSOR DE PORTUGUÊS

O doutor Tomás António Gonzaga, magistrado no Brasil depois dos anos de Coimbra, já era quarentão – ou seja, um “cota”. Maria Doroteia – ou seja, a Marília, tinha só 17 anos… Estiveram para casar-se, mas as coisas correram mal. O poeta doutor acabou por morrer em Moçambique em 1810.

POETA TOMÁS ANTÓNIO GONZAGA

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
que viva de guardar alheio gado;
de tosco trato, de expressões grosseiro,
dos frios gelos e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal e nele assisto;
dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
das brancas ovelhinhas tiro o leite,
e mais as finas lãs de que me visto.
Graças, Marília bela,
graças à minha estrela!


IRROMPE D. JOÃO V

Palmas, senhor público, palmas para o senhor Poeta Tomás António Gonzaga!
Belos versos, sim senhor!

MADRE MARIA DO LADO

Mal também não faz tal poesia, enfim. Passemos de lado…

VOZ OFF

O século XVIII era o tempo desta poesia. Mas não só. O reinado do ouro despontava em luxos sumptuosos – para quem o tinha e o podia gastar, é claro… Mas a organização social e produtiva descambava. A agricultura caía. Nobreza e alto clero viviam bem. Mas o resto da sociedade, não. Claro que não.

D. JOÃO V

Não me lembro…

VOZ OFF

Em paz com Espanha, Portugal entra em monarquia absoluta nos reinados de D. Pedro II e de D. João V.

D. JOÃO V

Não me lembro… Venha mas é mais música e mais poesia, que eu estava a gostar!

PROFESSOR DE PORTUGUÊS

Apoiado, Sua Majestade, muitíssimo apoiadíssimo!

(Um aluno diz em àparte:)

Pronto, aí vem matéria para mais um teste…

PROFESSOR DE PORTUGUÊS

Um teste, não: um poema!

VOZ OFF

Faça-se luz no Século das Luzes! Ilumine-se o Iluminismo! E o cultismo e o conceptismo! E o despotismo! E o DomJoãoQuintismo!

(ENTRA POETA JOÃO XAVIER DE MATOS)

Eu também me chamo João…

D. JOÃO V

Ah grande João, venham mais cinco aqui pró Quinto!

(REI E POETA BATEM AS MÃOS À MANEIRA MODERNA)

POETA JOÃO XAVIER DE MATOS

Eu sou João Xavier de Matos. Dei-me bem com o Senhor Bispo de Beja, Doutor Frei Manuel do Cenáculo. Mas deixei-me de magistraturas e dei-me de corpo e alma à poesia, à boémia e à bebida.

(D. JOÃO V, QUASE EM SIMULTÂNEO, RIMA:)

Mas que rica vida! Só podias ser João!

POETA JOÃO XAVIER DE MATOS

Que assim sai a manhã, serena e bela!
Como vem no horizonte o sol raiando!
Já se vão os outeiros divisando,
já no céu se não vê nenhuma estrela.

Como se ouve na rústica janela
do pátrio ninho o rouxinol cantando!
Já lá vai para o monte o gado andando,
já começa o barqueiro a içar a vela.

A pastora acolá, por ver o amante,
com o cântaro vai à fonte fria;
cá vem saindo alegre o caminhante;

só eu não vejo o rosto da alegria:
que enquanto de outro sol morar distante,
não há-de para mim nascer o dia.


D. JOÃO V

Palmas, senhor público, palmas para o senhor Poeta João Xavier de Matos!

(FAZEM UMA VÉNIA O PROFESSOR DE PORTUGUÊS E O POETA; DIZ O PROFESSOR DE PORTUGUÊS:)

Viva a poesia portuguesa do século XVIII! E viva o Louriçal!

(REPETIÇÃO: Alunos, um por cada nome de terra, dizem:)

Antões
Barroca do Outeiro
Borda do Rio
Cabeços do Outeiro
Casais de Além
Casais do Porto
Casais Loureiros
Casal da Rola
Casal do Queijo
Casal Mouro
Casas Brancas
Castelhanas
Cavadas
Cavaditas
Cipreste
Enjoa
Espinheiros
Foitos
Furadouro
Louriçal
Matas do Louriçal
Matas da Vila
Moita do Boi
Outeiro do Louriçal
Ribeira de Santo Amaro
Santo António
S. João das Tábuas
Serafim
Torneira
Valarinho
Vale da Cabra.

MÚSICA / LUZES / IMAGENS

(SEGUE-SE JOGO POÉTICO DE DECLAMAÇÃO: CABE AO ENCENADOR A DISTRIBUIÇÃO QUANTITATIVA DE Nº DE VERSOS/ALUNO. O REFRÃO É PARA DIZER POR TODO O GRUPO/CORO A UMA SÓ VOZ:)

Século XVIII, ó Louriçal!
Uma coisa é vento; outra, convento!
Coisas bem e coisas mal
Sempre houve em qualquer tempo!

Madre Maria do Lado!
Absoluto Senhor D. João V!
Arroz, biscoitos e vinho engarrafado
Se um é branco, o outro é tinto!

De um lado o desagravo
Do Sagrado Coração.
A vida tem por vezes travo
Da mais pura adoração!

Azulejos azuis e brancos!
Colunas com capitéis!
Sapatilhas e tamancos!
E gerações mais do que seis!

REFRÃO
NOSSO É O LOURIÇAL
NOSSA É A NOSSA HISTÓRIA!
POR ACASO É NATAL
NOSSA É ESTA MEMÓRIA!

São anosque já lá vão
Muitos mais anos a vir.
Instituto D. João
Quinto e primeiro a surgir.

Sim, viver é uma escola
E esta escola é viver!
É meter coisas na tola
P’ra lembrar e p’ra esquecer!

Ao António José da Silva
O Judeu, o do teatro,
Meteram no Santo Ofício,
Fizeram o diabo a 4!

REFRÃO
NOSSO É O LOURIÇAL
NOSSA É A NOSSA HISTÓRIA!
POR ACASO É NATAL
NOSSA É ESTA MEMÓRIA!


Quando fizeram o convento
Ai nem água nem torneira!
Mandou o Rei João e Quinto
Ao arquitecto Manuel Pereira

Que água desse às Irmãzinhas
Em forma de aqueduto.
Assim foi: e as alminhas
Vieram para o Instituto!

DIZEM TODOS A UMA SÓ VOZ
Instituto D. João V?

REFRÃO
NOSSO É O LOURIÇAL
NOSSA É A NOSSA HISTÓRIA!
POR ACASO É NATAL
NOSSA É ESTA MEMÓRIA!

Passarola, Passarola,
Passarola de Gusmão:
Vem aqui à nossa Escola
Voa lá, que é condição
Não voar só pelo chão!


(ENTRA BARTOLOMEU DE GUSMÃO)

Sou Bartolomeu de Gusmão.
Quis voar em máquina que voasse.
Muita gente se juntou a ver a minha Passarola.
Uns dizem que voou deveras. Outros, que não levantou o pé do chão.

(UMA FREIRA DÁ MILHO À PASSAROLA E DIZ:)

Só os anjos voam e não comem, ó pássaro artificial.
E tu comes e não voas, que outros são os anjos e os pecados destas lisboas…
Anda, toma lá deste ouro do Brasil em pepitas de milhos, toma.

D. JOÃO V

Ó Irmã, olhe que depois de mim há-de D. José trazer-vos um passarão bem pior, um tal Marquês de Pombal, ou o Diabo por ele…

(FREIRAS EM GRUPO REPETEM CENA DE JOELHOS E EM PÂNICO:)

Jesus Senhor, a República, a República, o Monstro Vermelho e Verde!
Jesus Senhor, livrai-nos de todo o mal!

D. JOÃO V

A República? O Marquês? Também não foi bem assim… Mas que foi coisa séria, lá isso foi… Nada ficou na mesma, sobretudo depois do Terramoto de Lisboa em 1755, que disso me livrei eu com cinco anos de avanço…

(VOLTA A FALAR O GRUPO/CORO DE ALUNOS:)

Sempre a História é memória,
Sempre foi e há-de ser.
Estar vivo é uma glória
Entre nascer e morrer.

Entre nascer e morrer
Muita história a correr
Sempre foi e há-de ser
Entre morrer e nascer.

REFRÃO
NOSSO É O LOURIÇAL
NOSSA É A NOSSA HISTÓRIA!
POR ACASO É NATAL
NOSSA É ESTA MEMÓRIA!


(CENA CONTINUA COM DICÇÃO DE FRASES – NÃO JÁ EM REGISTO POÉTICO-DECLAMATÓRIO – DISTRIBUIR 1 FRASE/1 ALUNO:)

(MAS PRIMEIRO FALA O REI:)

“D. João por Graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves e d’além-mar em África Senhor da Guiné Etcetra…”

(FALA DEPOIS MADRE MARIA DO LADO:)

Eu trabalhava no serviço da casa até às dez ou onze horas da noite: depois rezava o meu rosário e logo de madrugado me punha em oração, antes de entrar nos serviços da casa.

D. JOÃO V (apontando para Madre Maria do Lado:)

Tua memória bem mereceu um convento para a História.

MADRE MARIA DO LADO

Como por meio da oração se chega cada vez mais a Deus Senhor nosso, forçoso é que, tendo a luz tão perto, dela se receba grandes iluminações.

BARTOLOMEU DE GUSMÃO

De mim, Bartolomeu Lourenço de Gusmão, que sacerdote fui como cientista, não grande memória fique, enfim, que homem fui apenas: pó ao vento. Mas de meu sonho de voar, sim: que memória fique. Uma simples bolha de sabão me deu desejo de construir um balão que a imitasse em graça e leveza. Do balão à Passarola, foi um golpe de asa. E a 8 de Agosto de 1709, a minha Passarola pegou lume de voo… e voou da Casa da Índia ao Terreiro do Paço!

(FREIRAS TORNAM A DAR MILHO À PASSAROLA, DIZENDO:)

Toma e come destas pepitas de ouro brasileiro, ó Passarola do Padre Voador!
Toma e come – e que só as almas voem, mas para Deus, não para lado mais algum!

(VOLTA GRUPO/CORO DE ALUNOS; 1 FRASE/1 ALUNO)

Século XVIII, ó século XVIII dos Távoras e do Terramoto de Lisboa: nem tudo teu foi coisa boa!
Mas vale a fé como vale a razão!
As Luzes nascem das Sombras!
Também Bocage nasceu e renascerá!
Tanto ouro e tantos pobres ao mesmo tempo!
Tantos bispos, tantos cónegos, tantos nobres, tantos pobres!
Tanto aumentar de impostos!
Tanto Brasil e tão pouco Portugal!
Vinhas do Douro, vinhos da Madeira!
Tantas guerras do Alecrim e da Manjerona!
D. João V para D. José: dá cá o pé!
Todo o Portugal do Marquês de Pombal (incluindo o Louriçal)!
E tanta, tanta Inquisição a dar cabo da Razão!
Venha de ti o Iluminismo!
E o Cosmopolitismo!
E o Louriçalismo!

FINAL

(Um aluno diz:)

Duas freguesias compunham a velha Vila do Louriçal: S. Tiago e S. Mamede, ali à Mata Mourisca…

VOZ OFF

E hoje, quem somos hoje?

(REPETIÇÃO: Alunos, um por cada nome de terra, dizem:)

Antões
Barroca do Outeiro
Borda do Rio
Cabeços do Outeiro
Casais de Além
Casais do Porto
Casais Loureiros
Casal da Rola
Casal do Queijo
Casal Mouro
Casas Brancas
Castelhanas
Cavadas
Cavaditas
Cipreste
Enjoa
Espinheiros
Foitos
Furadouro
Louriçal
Matas do Louriçal
Matas da Vila
Moita do Boi
Outeiro do Louriçal
Ribeira de Santo Amaro
Santo António
S. João das Tábuas
Serafim
Torneira
Valarinho
Vale da Cabra.

MÚSICA / LUZES / IMAGENS

(OS ALUNOS REPETEM, PARA ACABAR E DESPEDINDO-SE DO PÚBLICO (MAS AGORA A UMA SÓ VOZ:)

Ó Louriçal,
terra de encanto certo,
com aroma de pinhal
e do mar que fica perto

Ó Louriçal,
de profunda tradição,
tu não conheces o mal
e dás bom nome à região.


Caramulo, 25 e 26 de Novembro de 2007

3 comentários:

Paula Sofia Luz disse...

Falta só a minha quadra favorita:
O arroz nasce
e o tinto reluz
à mesa bem popular
e até parece
que a própria luz
se alegra a iluminar...

bjs

Gabriel Oliveira disse...

Ah, grande Daniel! Um viva para ti!

LM,paris disse...

BRAVO!!!!!( oiçam os aplausos!!!)
mas que grande peça!
daniel nao vou estar no Louriçal...
so o nome jà é um poema...mas
adorei, os alunos desse liceu têm muita sorte!
Sim, mais três vivas pra si!!!!
bonne journnée!!!
um beijinho,
LM

Canzoada Assaltante