Para o senhor Maximino,
uma vez na vida.
I
Frutos foram já, folhas caem, vai frio o Outono.
Vi um homem completamente só na vida, um
antecipador da solidão completa de um dia.
Disseram-me: – Ele não tem família, ele vive
por aqui. Umas vezes, chove muito – e das pessoas
o olhar é limpo, vazio e velado como igrejas
por dentro.
Em sonhos, vejo mulheres de brancas barrigas
como peixes de ancas. Elas dançam na água.
Acho que é por causa de eu ouvir a chuva
enquanto as sonho – elas dançam no rumor.
E o frio Outono escreve folhas: cadentes, decadentes
poemas frios que o níveo vento atravessa
no meu coração portátil.
Bordo passos no parque da vila, topando a
inquietude na quietude. Um espelho-de-água
escreve peixes: os peixes olham de baixo as folhas
à água caídas como versos a papel.
É uma quinta-feira.
Vejo homens, mulheres e crianças que não estão
nem há. Preparo a paz: uso os olhos da pele.
Cabanas na neve emolduram salas de espera:
a louça dos dentes guardada na madeira da boca:
o concurso atento dos corvos à vida:
dimensões que rexistem no Elemento.
Trabalharei ainda um pouco no não-bosque.
Minérios vegetam na Eternidade.
Tentarei imitá-los em atento concurso.
Olhai comigo estes homens varrendo folhas:
o de óculos arrasta estrofes de caduca rima,
o de bigode pensa numa filha,
o condutor acende um cigarro,
dá-lhes o Outono trabalho
como a mim dá – ou vai-vem dando.
No estojo do corpo, as jóias dos órgãos
são, cada, um relógio. A um universal
tempo comum concorrem.
E a solidão é feita de nenhum onde e de todos
os quandos.
Bebe o homem só uma chávena de café chilro.
Vai frio o Outono.
Admirável e admirado renque de árvores
junto a que, invernoso, outonizo:
dos deuses a agonia celebrareis verticais,
como desde sempre – como pedras.
Celebro o Instante – O que É Dentro.
Um irmão telefona a um irmão:
densas sublinhas escrevem as falas:
como num teatro sem bilhetes pagos,
de para morte e vida entrada livre.
É-me hoje, quinta-feira, possível
tudo:
e outra vez.
Tentarei imitar, das gares rodoviárias,
o concurso de senhoras-de-aluguer,
a prosperidade das farmácias,
a vitalícia vida que obra obras e semáforos:
maila dulcíssima tristeza dos semáforos
quando chove e
quando não.
Todos os quandos – e nenhum onde.
Espera.
Frutos voltarão, folhas subirão e
será quente o Verão.
II
Elas dançam na água.
Não me cansam nem causam
senão felicidade: sonhar é
roubar tempo ao Tempo.
São dançarinas. São
mulheres frias como igrejas.
São brancas ao sol, mas
lunam terríveis segredos.
Caudaloso e voraz e gástrico é
o senhor coração.
Gosta de poças de água.
Gosta de dançarinar peixes.
Revoluteiam vagens e aranhas,
radiografias solares de parras
em latadas de velhos senhores,
em alguma aldeia desabitada.
Frutos foram já, folhas caem, vai frio o Outono.
Vi um homem completamente só na vida, um
antecipador da solidão completa de um dia.
Disseram-me: – Ele não tem família, ele vive
por aqui. Umas vezes, chove muito – e das pessoas
o olhar é limpo, vazio e velado como igrejas
por dentro.
Em sonhos, vejo mulheres de brancas barrigas
como peixes de ancas. Elas dançam na água.
Acho que é por causa de eu ouvir a chuva
enquanto as sonho – elas dançam no rumor.
E o frio Outono escreve folhas: cadentes, decadentes
poemas frios que o níveo vento atravessa
no meu coração portátil.
Bordo passos no parque da vila, topando a
inquietude na quietude. Um espelho-de-água
escreve peixes: os peixes olham de baixo as folhas
à água caídas como versos a papel.
É uma quinta-feira.
Vejo homens, mulheres e crianças que não estão
nem há. Preparo a paz: uso os olhos da pele.
Cabanas na neve emolduram salas de espera:
a louça dos dentes guardada na madeira da boca:
o concurso atento dos corvos à vida:
dimensões que rexistem no Elemento.
Trabalharei ainda um pouco no não-bosque.
Minérios vegetam na Eternidade.
Tentarei imitá-los em atento concurso.
Olhai comigo estes homens varrendo folhas:
o de óculos arrasta estrofes de caduca rima,
o de bigode pensa numa filha,
o condutor acende um cigarro,
dá-lhes o Outono trabalho
como a mim dá – ou vai-vem dando.
No estojo do corpo, as jóias dos órgãos
são, cada, um relógio. A um universal
tempo comum concorrem.
E a solidão é feita de nenhum onde e de todos
os quandos.
Bebe o homem só uma chávena de café chilro.
Vai frio o Outono.
Admirável e admirado renque de árvores
junto a que, invernoso, outonizo:
dos deuses a agonia celebrareis verticais,
como desde sempre – como pedras.
Celebro o Instante – O que É Dentro.
Um irmão telefona a um irmão:
densas sublinhas escrevem as falas:
como num teatro sem bilhetes pagos,
de para morte e vida entrada livre.
É-me hoje, quinta-feira, possível
tudo:
e outra vez.
Tentarei imitar, das gares rodoviárias,
o concurso de senhoras-de-aluguer,
a prosperidade das farmácias,
a vitalícia vida que obra obras e semáforos:
maila dulcíssima tristeza dos semáforos
quando chove e
quando não.
Todos os quandos – e nenhum onde.
Espera.
Frutos voltarão, folhas subirão e
será quente o Verão.
II
Elas dançam na água.
Não me cansam nem causam
senão felicidade: sonhar é
roubar tempo ao Tempo.
São dançarinas. São
mulheres frias como igrejas.
São brancas ao sol, mas
lunam terríveis segredos.
Caudaloso e voraz e gástrico é
o senhor coração.
Gosta de poças de água.
Gosta de dançarinar peixes.
Revoluteiam vagens e aranhas,
radiografias solares de parras
em latadas de velhos senhores,
em alguma aldeia desabitada.
Textos: Caramulo, tarde e noite de 22 de Novembro de 2007
Fotografia: Caramulo, manhã de 19 de Novembro de 2007
Fotografia: Caramulo, manhã de 19 de Novembro de 2007
4 comentários:
Apesar de "poemas frios" é óptimo sentir a (sua) esperança nos mesmos. Boa!!
A palavra "esperança" é engraçada: sempre me fez rir.
Bonsoir,
dançar com os peixes...
as mulheres sereiam outras,
e o mar engole-as
com tanto furor!
Adorei!
Café childro, é lindo e nao sei o que é, nao diga, faz-me sonhar. Beijinhois, Lidia
Gosto da imaginação vocabular e da verosimilhança espectral das personagens que habitam no limbo das pastelarias e cafés de província.Muitas vezes,quase sou uma delas.
Bons poemas,Daniel Abrunheiro!
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