ORATÓRIA
DO NOME
Leiria,
quarta-feira, 12 de Março de 2014
O nome dele levo e trago no meu corpo.
Pertenço todo a esse nome como dele todo
fui.
Agora é entre outros papéis que me deixo.
Moro longe do mar mas é barcos que vejo.
Cerrar os olhos me basta a ser náutico.
Dele o Irmão Alberto hoje faz cem anos.
Faz sem fazer, morto profissional desde
1980.
Mas digo eu que faz, cerrados os olhos,
serrado o olhar.
O nome dele leve enquanto trago.
Enquanto o amargo vinho trago fora dele.
Quididade me basta e sobra: de Coimbra
camponês.
Hoje enfim mais dado ao operariado a lápis.
Distribuidor de pão-de-pombas.
Pardais às vezes, quando a mansa brisa
amansa.
Nada de muito importante, um deix’andar.
Açucaro o vasto deserto ilegível.
Chamam-me pelo nome dele.
Viro-me, é afinal só comigo a sós, que é
dele.
Sem fazer ondas, sem senão aflorar o
precipício.
Ainda não é a cegueira, ainda não é já
renascer.
POR
AQUI NÃO HÁ INGLESES NEM INGLESAS MAS
Id.,
id., id.
Três homens, um de cada vez.
Nenhum deles é Drake.
Nenhum deles, Clarke.
Nenhum, Greene.
Portugueses, estes.
Um é bancário.
Outro também mas de outro balcão.
O derradeiro é senhorio, vive do ar dos
outros:
respirar torna-o rico.
Homens como casas: tarjados a azul por
baixo.
Tenho comigo uma libra para gastar em vinho
& biscoitos.
Sendo menos amargo no nome: roxeando a
boca.
Posso passar-ser o resto da vida a fazer
isto.
Isto: a diluir o deserto que vai.
O deserto que vai da palavra
cara
à palavra
rosto.
Uma malga de sopa à
face
da lareira, numa tarde fria comida a sós.
Agora que a Primavera se conjura/conjuga.
Copo de água açucarada pela garganta.
Até ao fosso do estômago, águ’açúcar.
Estas três mulheres agora na tarde.
Nenhuma é Maureen.
Nenhuma é Cora.
Nenhuma, Rosie Ann.
Portuguesas como telhas vermelhas, todas.
Duas prostituem-se tipo deLuxe.
Éguas caras de montar, a avaliar pelos
adereços.
A outra gosta de ler porcarias: Danielle
Steel, MST.
Antes de as receber neste caderno, fui-me a
casa.
A essa hora ninguém nela, só os retratos.
Tenho algum tempo agora.
Na praça calçada à portuguesa.
Na praça, um restolho de cadeiras-mesas
azuis.
Humanos entorpecidos derredor.
Lagartam-se ao bom sol de Março.
Jibóiam as falas.
Uma das de aluguer diz a palavra
parábola.
Esta deu aquela em étimãelogia.
Rapazes de gravata mal-acabados de criar.
Cheiram ainda a cueiro púbere.
Professoritas envelhecidas com água
mineral.
Uma careca reverberante como um farol.
Pertence àquele cavalheiro de
casac’antílope.
Ao longe (mas perto de mais) o alarme de um
carro.
Passa uma rapariga silfidesca.
Cabelo-caril, túnica roxa à
Senhor-dos-Passos.
Sandálias douradas, em que dois pés sem
peso.
Escrevive-se aqui em razoável qualidade de
vida.
Posso (&passo) o resto da vida em
anotação.
Quase nem crio: o mundo dá de si.
Cerro os olhos, cedo à epifania voluntária.
Epifania voluntária: vento penteando
trigais.
Ouro maduro. Chapéus lenç’atados ao
pescoço.
Ar-vidro-ardente reverber’ondulando
fornalha.
Talvez tome outro café, veio morno o
primeiro.
Cálidas maravilhas para trazer à boca.
Agora um homem de cachaço vermelho.
Afogueado seu bafo, seu baço: gostador de
bagaço.
Como eu, menos a parte do cachaço, a
cachaça.
O Inverno de 81 foi fronteiriço na minha
vida.
O Outono de 86 também.
Em Janeiro de 85 um dente ia dando-me cabo.
Em 89 abri uma janela ao vasto nada.
Foi uma década interessante.
Ainda bem que está morta.
O Maradona senhoreava então o mundo.
Não sei para nem por que falo nisso.
Tudo irrisório, risível tudo.
Uma friúra de convento nos ossos, às vezes.
Progressão na carreira – digo: no bolor.
Namoradas profissionais.
Aquelas duas, digo.
Digamo-las:
Maureen Drake & Cora Clarke.
Mais do que as duas esperta, a Rosie Ann
Greene:
senhoria, a magana.
CÉLERE
SÍLFIDE
Id.,
id., id.
Donairinha rapariguinha
levezinha avezinha
passa paira pára espairece
decide-se pela esquerda
& desaparece.
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