O
primeiro a sair que diga por onde é que
Antigamente, só de alguns ofícios se podia
afirmar, com razoável caução e inspirada garantia, que eram
profissões/carreiras de muita saída.
Por aflitiva e angustiosa e factual tristeza, hoje são-no quase todas: os
professores estão de saída, os
enfermeiros dirigem-se à saída
aeroportuária, os operários navais estão como na canção do Fausto: “o barco vai de saída”, os funcionários
públicos idem e etc. – tudo e todos tão de
saída, que os mais novos nem a entrar chegam.
É isto que a lápis mental vou penosamente
considerando quando dou de fuças, em parede antiga de viela baixa-histórica, com
a seguinte gritante-garrafal-caixa-alta-vermelha-spray inscrição:
CRISTO
VAI VOLTAR
–
Outro D. Sebastião… –
rosno eu para com as minhas miudezas botão-acústicas. – Ele que não faça isso, que neste morredouro de míseros nem para Ele
há milagres – cuspinho eu à maneira dos fumadores de mata-ratos.
Tenho rosnado muito. Muito e em vão, à
catedrática maneira dos revolucionários de sofá, neste cada vez mais redoliano barranco de cegos a que não adianta
bradar Alto e pára o braille! Rosnar,
rosno – mas quase tudo do quase-nada em que esta choldra piolheira descambou me
dá pigarro canídeo à interjeição. E logo a mim, espécie de lobo desdentado que,
se e quando alguma coisa mastiga que não seja o próprio cuspo, o faz mercê de uma
geringonça dentada à base de resina acrílica plastificadora até do sorriso,
quando algum.
No bolso dextro do blusão, porto um poema
de amor inçado e inchado de turva fatalidade. Mandou-mo um amigo tristonho como
eu, que como eu e comigo se carteia electronicamente a mote de tudo o que seja
indignações, gajas boas e piadolas frescas. Reza assim a missiva (que fiz
imprimir por masoquismo):
“Descemos 3 posições no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU.
1,4 milhões de desempregados.
Défice sem baixar.
Dívida a chegar aos 220 mil milhões.
Adiamento do pagamento de dívida através da troca, de uma taxa de juro de 1,5%, para outra de 4,5%.
PIB ao nível de 2001.
250 mil emigraram, só desde 2011.
2 milhões de pobres, em 2011. E em 2013, 2,750 milhões.
E agora, dados de 2013, 660 mil famílias não conseguiram pagar empréstimos à banca.
500 mil pessoas com salários penhorados em 2013, recorde.
Mais de 14 mil presos nas cadeias portuguesas em 2013, recorde.”
Dívida a chegar aos 220 mil milhões.
Adiamento do pagamento de dívida através da troca, de uma taxa de juro de 1,5%, para outra de 4,5%.
PIB ao nível de 2001.
250 mil emigraram, só desde 2011.
2 milhões de pobres, em 2011. E em 2013, 2,750 milhões.
E agora, dados de 2013, 660 mil famílias não conseguiram pagar empréstimos à banca.
500 mil pessoas com salários penhorados em 2013, recorde.
Mais de 14 mil presos nas cadeias portuguesas em 2013, recorde.”
Relendo-a pela enésima-cagagésima vez, sinto-me (e
arvoro-me logo em) Pirro. Era no ano 279 a.C. E o generalíssimo assim para os
seus oficiais: “Outra vitória como esta e
estamos perdidos.”
Tenho para comigo e por certo que o género humano é
o maior erro trágico da Natureza, não de Darwin nem do tal Cristo que há-de
voltar mas é o caraças. Na mesma linha, o cancro é uma moléstia estúpida
porque, matando o hospedeiro, se mata a si mesmo, coisa que equivale, sem tirar
nem pôr, ao capitalismo selvagem made in
América & Berlim. E o seguidismo acrítico é uma manifestação clara da
escura acefalia – mas vão lá dizer isso aos tontos dos Ucranianos, mortinhos
como andam para que lhes troikem a
vida como a nós nos troikaram os passos.
Definitivamente provisório como a vida mesma,
resgato-me destas tristuras macambúzias ingressando numa tasca à antiga
portuguesa no propósito de beijar, à maneira de artista, um càlicezito de
bagaço daquele áspero-carvalhoso que sulc’arranha arrepios cuteleiros na isca
da figadeira. Em meu derredor, o antro jubila de colegas desempregados e de
reforma-roubados que bebem do mesmo enquanto lambem a bisca ou concatenam o
espinhaço de baquelite do dominó. É então que, compulsando a edição do dia do Diário de Notícias, um gajo alto de
gestos alquebrados que lhe tornam a locomoção parecida com a dos que acarretam
cegonhas mortas às costas, é então que ele altivozeia assim:
“Então vossemecêzes não me querem ver esta? O Pintas da Bosta agora quer
que o meu Sporting desça de divisão! Diz ele que o puto presidente de Alvalade
não sei quê coacção dos árbitros! Porra, ao cabo de 30 anos de trafulhices
larápias, este gajo ainda tem a alma ao lado do cu para ladrar merdas destas
sem vergonha nenhuma, c’um carácio, ó pàzinhos! Sempre quero ver a que saída
vai dar isto!”
– Também
eu
– volto eu a rosnar para comigo. – Também
eu. Mas dá-se que, apontando eu o nariz à saída do tabernoso palácio, se me
escapa audível um “Enfim, mais do mesmo.”
Solícito, o taberneiro serve-me outro conhaque nacional, glaucoma líquido do
olho do Diabo, a que, enfim, dou honras de escorropicho com uma cabeçada de
arrecuas tecnicamente perfeita.
E acabo por ali ficar ronro(s)nando
solilóquios de beberrão impenitente e resignado ante a evidência de nem isto nem a taberna terem, como é que eu
dizia?, saída nenhuma que não seja
para pior.
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