Era muito o amor
Assim está escrito na página 38 de um livro, esqueci qual, quem quiser saber só tem de abrir todos os livros portugueses na página 38, que por ser par fica do lado esquerdo, o do muito sítio - o do coração.
Era muito o amor
Mas nisto entra no café da aldeia um maluco de outra aldeia, como se esta não tivesse já bastantes. Este vive a fantasia de ser polícia e uniforma-se a rigor. Tem um dólman verdadeiro, um cassetete pintado de branco e um coldre também branco de tinta de armário de cozinha. Veste adequado par de calças de azul-escuro. A coisa só descamba no calçado: um par de botas de borracha. No entanto, as botas são debruadas a amarelo-adesivo no alto do cano. Tem olhos de um azul aguado: um azul magoado.
O polícia falso bebe uma cerveja verdadeira, vai ao lavatório molhar as mãos, leva a mão direita pingando ainda à sobrancelha do mesmo lado (falta-lhe só o boné) e, boatardando os presentes, sai de cena.
Pergunto à senhora do balcão por ele.
- É um de Santiago que não funciona bem, tem a mania que é polícia. Mas este não faz mal a ninguém. A guarda já lhe tirou o uniforme umas vezes por causa de ele fazer operações stop, mas ele arranja logo outro, não se sabe como. Agora ele disse que se os guardas lhe tirarem outra vez a farda, que ele vai pegar fogo às matas. E capaz disso é ele.
Era muito o amor
E o amor, toda a gente sabe, é fogo que arde etc.
Botulho, noite de 24 de Setembro de 2005
1 comentário:
Ai era?
Enviar um comentário